sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Uma questão de respeito

Respeitar significa não impor determinada visão de mundo em preferência a outra, e sim dar margem para que as diversas visões possam coexistir pacificamente

Toni Reis, O Globo
Respeito se aprende em todos os lugares, na família, na escola, na sociedade. E preconceito também. Como bem disse Nelson Mandela, “ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele ou por sua origem ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se elas aprendem a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto. A bondade humana é uma chama que pode ser oculta, jamais extinta.”
A mídia é um reflexo da sociedade em que vivemos. Porém, além de retratar e reproduzir o que ocorre na sociedade, também desempenha um papel educador, fazendo a difusão de informações e conhecimentos que, caso contrário, não estariam ao alcance de muitas pessoas. É um papel ao mesmo tempo muito forte e também muito delicado. Forte porque tem o poder de atingir as pessoas em massa e influenciar suas opiniões. Delicado porque, sem o devido cuidado e a devida ética, em vez de educar, pode manipular e colocar segmentos da sociedade em posições antagônicas, promovendo discórdia e tensões sociais.
Ao tratar de temas considerados por alguns como polêmicos ou até tabus, a mídia, quando utilizada de forma ética, pode contribuir para elucidar, desmistificar e promover a compreensão do “diferente”, incentivar a reflexão e dar subsídios para o respeito àquilo que antes talvez tenha sido objeto de desprezo e preconceito. Este é fruto da ignorância e do desconhecimento, da falta da capacidade de analisar criticamente as crenças, as opiniões e as informações que nos cercam e que podem formar o “senso comum” capaz de levar à marginalização determinados grupos na sociedade.
Respeitar é diferente de aceitar. Também é diferente de tolerar, no sentido de suportar com condescendência. Não é necessário aceitar aquilo que difere das nossas convicções pessoais. Mas respeitá-lo significa reconhecer que existem diferenças entre as pessoas, e nem por isso necessariamente umas têm mais valia que outras. Significa conviver harmonicamente em uma sociedade indubitavelmente plural, diversa e heterogênea. Significa não impor determinada visão de mundo em preferência a outra, e sim dar margem para que as diversas visões de mundo possam coexistir pacificamente.
Um exemplo da abordagem pelos meios de comunicação de assuntos às vezes considerados polêmicos são as cenas de afeto entre as pessoas nas telenovelas. O primeiro beijo heterossexual nas novelas brasileiras aconteceu em 1952 e provocou um rebuliço. Hoje, quando retratado com sensatez, é visto como um acontecimento natural. Não choca mais, não porque banalizou, mas porque as atitudes predominantes se tornaram mais permissivas.
O primeiro beijo “gay” numa novela da Rede Globo ocorreu entre os personagens Félix e Niko da novela “Amor à vida”, em 2014 — 62 anos depois do primeiro beijo hétero em “Sua vida me pertence”. Também provocou um impacto. Além disso, refletiu que, apesar de lentamente, vem ocorrendo o reconhecimento e a maior visibilidade dos relacionamentos homoafetivos na sociedade brasileira, “com ou sem permissão”, para parafrasear o poeta uruguaio Mario Benedetti.
A Rede Globo é uma das maiores produtoras de entretenimento do mundo e tem contribuído em suas novelas e outros programas para a promoção da dignidade humana. E sempre tem escutado as demandas da sociedade em relação ao respeito aos direitos humanos. Progressivamente, nas últimas duas décadas tem abordado, noticiado e retratado com respeito as vivências de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT).
O ápice da teledramaturgia global neste sentido ocorreu na novela “Liberdade, liberdade”. Houve a primeira cena de uma relação sexual entre pessoas do mesmo sexo, em horário apropriado, com a maior sensibilidade, discrição e com toda a liberdade de criação dos autores. Pôde demonstrar que esta situação existe desde que o mundo é mundo, inclusive nos anos coloniais do Brasil. Em tempos de intolerância, terrorismo, estupros coletivos... uma cena de amor ainda pode chocar, mas é necessária. “Liberdade, liberdade” fez história e vai deixar saudade.
Contemplar a sociedade na tela é uma forma de educar de maneira subliminar para o respeito. Contribui para o que a ONU tem denominado “cultura da paz”, definida como “trabalhar de forma integrada a favor da construção de uma sociedade pautada nos valores de justiça social, igualdade entre os sexos, eliminação do racismo, tolerância religiosa, respeito às minorias, educação universal, equilíbrio ecológico e liberdade política.”
Como gay casado há 26 anos com meu marido, que tem lutado a duras penas no Judiciário para conseguir o cumprimento do respeito à igualdade de direitos, como o reconhecimento da nossa união e a adoção dos nossos três filhos lindos, congratulo a Rede Globo pela sua iniciativa e seu desempenho em promover o respeito a todas e todos, inclusive as pessoas LGBT.
Coexistir (Foto: .coexistence.art.museum)
Toni Reis é secretário de educação da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Reportagem da Revista CULT deste Mês Famílias, o plural da questão - As novas configurações familiares

Toni e David na companhia dos  filhos  de Alyson, Jéssica e Filipe

O brasileiro Toni Reis, 51 anos, conheceu o inglês David Harrad, 57, na Inglaterra, em 1990, e eles iniciaram um namoro. Em 1991, decidiram mudar-se para Curitiba. “Na época, não havia reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo no Brasil, então David não podia ter um visto de permanência com base na ‘reunião familiar’, como acontecia para casais binacionais heterossexuais”, conta Toni. David permaneceu irregular no Brasil, foi autuado em 1996 com ameaça de expulsão do país, e só veio a conseguir o visto permanente em 2005. Nesse ano começou uma nova luta: adotar como casal o primeiro filho. “Se adotássemos separados, como solteiros, e um de nós viesse a falecer, o outro não teria o direito da guarda da criança.” Foram três anos até conseguirem a permissão da adoção conjunta, mas com a condição imposta pelo juiz de que a criança tivesse mais de dez anos e que fosse menina. “Achamos que a decisão foi discriminatória e recorremos. Na segunda instância, ganhamos por unanimidade o direito de adotar conjuntamente sem qualquer restrição”, conta Toni. “No entanto, um promotor do Ministério Público recorreu e levou o caso ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, alegando que casais do mesmo sexo não formam uma família. O STF rejeitou o recurso, mas o STJ só proferiu sua decisão em 2014, retirando a possibilidade de adotarmos na nossa comarca. Uma demora judicial um tanto cruel. O promotor recorreu novamente da decisão do STJ e a ministra Carmem Lúcia decidiu a nosso favor em março de 2015, dez anos após o início do processo de adoção.”

A primeira adoção, iniciada em 2011 com Alysson, 11 anos, não foi fácil. O menino havia fugido de sete abrigos e sido rejeitado pela mãe todas as vezes em que tentou voltar para casa. Quando o casal conheceu Alysson, o garoto estava há um ano na casa de uma família de testemunhas de Jeová, que tentou influenciá-lo a rejeitar a adoção. Toni conta que Alyson chegou a declarar: “Sabiam que eu tenho nojo de homossexuais?” no dia em que foram fazer uma nova carteira de identidade para o filho. Depois de vários encontros e grupos de ajuda, Alyson superou o preconceito e hoje a família tem mais dois filhos, os irmãos Jéssica, 12 anos, e Felipe, 8 anos.

Famílias, o plural da questão

As novas configurações familiares brasileiras exigem leis e discussões sobre identidade, afeto e núcleo familiar
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por Laís Modelli
A decisão é recente: o Brasil permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo desde maio de 2013. Na data, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução n. 175, que obriga os cartórios brasileiros a converterem união estável homoafetiva em casamento. Somente naquele ano, o país registrou 3,7 mil matrimônios entre pessoas do mesmo sexo, segundo dados do IBGE de dezembro de 2014. São Paulo foi o estado com maior número de registros, com 1945 casamentos (897 uniões entre homens e 1.048 entre mulheres), enquanto o Acre foi o único estado a não celebrar nenhum registro no ano.
Apenas 22 países no mundo permitem o matrimônio homoafetivo e reconhecem os direitos dos parceiros homossexuais, como a licença-maternidade, a adoção de filhos, a herança e o divórcio. A Holanda foi o primeiro país a garantir tais direitos, aprovados em dezembro de 2000. Na ordem cronológica de aprovação, fazem parte da restrita lista: Bélgica (2003), Espanha (2005), Canadá (2005), África do Sul (2006), Noruega (2009), Suécia (2009), Portugal (2010), Argentina (2010), Islândia (2010), Dinamarca (2012), Brasil (2013), Uruguai (2013), Nova Zelândia (2013), França (2013), Inglaterra (2014), País de Gales (2014), Escócia (2014), Luxemburgo (2014), Finlândia (2015), Irlanda (2015) e Estados Unidos (2015).
Segundo o deputado federal Jean Wyllys, autor de projetos voltados para o público LGBT, a experiência argentina deve ser seguida no Brasil. “A Argentina é o país com a legislação mais avançada do mundo em matéria de direitos da população LGBT. A campanha pelo casamento civil igualitário, aprovado em 2010, promoveu um intenso e frutífero debate nacional sobre os direitos LGBT. Depois do casamento, outras leis foram aprovadas, como a de identidade de gênero, e diversas políticas públicas foram implantadas. Houve uma mudança enorme na percepção da sociedade argentina sobre a diversidade sexual”, explica Wyllys.
Ainda que o Brasil garanta o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a juíza aposentada Maria Berenice Dias explica que o país não assegura o direito por força de lei, mas somente por decisão da Justiça. “Por não existir essa lei, ainda há espaço para que iniciativas como o Estatuto da Família ganhem espaço”, explica Berenice. Proposto pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, o Estatuto da Família é um projeto de lei, em tramitação, que tenta definir o que pode ser considerado uma família – excluindo, entre outras configurações, a união entre pessoas do mesmo sexo. De acordo com a ala progressista de juristas brasileiros, o Estatuto da Família não tem sentido de existir, uma vez que ser homossexual não é ilegal no país. “A Justiça avançou graças ao poder judiciário e assegurou o direito de casamento entre pessoas de mesmo sexo, mas o Estatuto da Família foi uma manobra para tentar excluir esses direitos que já estão assegurados. Nosso Legislativo, conservador e preconceituoso por ordem religiosa, planta posições extremamente reacionárias”, afirma a jurista.
Para Jean Wyllys, os parlamentares que apoiam o Estatuto da Família sabem que ele não pode ser aprovado. “A única finalidade desse projeto, do ponto de vista legal, é retirar direitos de uma parcela da população. É como se um deputado apresentasse uma lei para que os negros deixassem de ter algum direito que atualmente têm, ou os judeus, ou as mulheres etc. É, na verdade, um Estatuto Contra Uma Parte Das Famílias, e que nada traz de bom para as demais famílias. É perverso. A finalidade política do projeto – e os deputados sabem que não vão conseguir aprová-lo – é usá-lo como propaganda para promover o ódio e a violência”, afirma.
Além da resolução de 2013, o Conselho Nacional de Justiça já havia avançado na questão das famílias homoafetivas em 2009, quando mudou o padrão da certidão de nascimento do tradicional “pai e mãe” para o termo “filiação”.
Making of do ensaio fotográfico de Simone Rodrigues para o livro Nomes do amor / Foto:b Simone Rodrigues
Making of do ensaio fotográfico de Simone Rodrigues para o livro Nomes do amor / Foto: Simone Rodrigues
A homoafetividade antes dos anos 2000
Berenice, a primeira mulher juíza do Rio Grande do Sul, foi responsável pela decisão pioneira no Brasil de reconhecer, em 2001, um casal de homens como uma família. “Eles viveram juntos por 27 anos, até que um deles faleceu. Ele tinha patrimônios adquiridos antes do começo da união, o que não dava para reconhecer como uma sociedade entre os dois”, explica. “A discussão era: se eles fossem reconhecidos como casal, haveria um herdeiro; caso contrário, o parceiro não teria direito a nada e todo o patrimônio iria para o município. O caso se tornou chocante ao demonstrar que aquele homem, que tinha acompanhado seu parceiro a vida inteira, de repente ficaria até sem casa para morar porque eles não eram reconhecidos como família.” A decisão de Berenice, junto a seus colegas do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, considerou que família é determinada pela relação de afeto e não pelo gênero dos parceiros. A partir do caso, a juíza conseguiu mudar o termo de “homossexualidade” para “homoafetividade”. “A troca foi importante por esclarecer que os relacionamentos não devem ser da ordem da sexualidade, e sim da ordem da afetividade”, explica.
O brasileiro Toni Reis, 51 anos, conheceu o inglês David Harrad, 57, na Inglaterra, em 1990, e eles iniciaram um namoro. Em 1991, decidiram mudar-se para Curitiba. “Na época, não havia reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo no Brasil, então David não podia ter um visto de permanência com base na ‘reunião familiar’, como acontecia para casais binacionais heterossexuais”, conta Toni. David permaneceu irregular no Brasil, foi autuado em 1996 com ameaça de expulsão do país, e só veio a conseguir o visto permanente em 2005. Nesse ano começou uma nova luta: adotar como casal o primeiro filho. “Se adotássemos separados, como solteiros, e um de nós viesse a falecer, o outro não teria o direito da guarda da criança.” Foram três anos até conseguirem a permissão da adoção conjunta, mas com a condição imposta pelo juiz de que a criança tivesse mais de dez anos e que fosse menina. “Achamos que a decisão foi discriminatória e recorremos. Na segunda instância, ganhamos por unanimidade o direito de adotar conjuntamente sem qualquer restrição”, conta Toni. “No entanto, um promotor do Ministério Público recorreu e levou o caso ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, alegando que casais do mesmo sexo não formam uma família. O STF rejeitou o recurso, mas o STJ só proferiu sua decisão em 2014, retirando a possibilidade de adotarmos na nossa comarca. Uma demora judicial um tanto cruel. O promotor recorreu novamente da decisão do STJ e a ministra Carmem Lúcia decidiu a nosso favor em março de 2015, dez anos após o início do processo de adoção.”
A primeira adoção, iniciada em 2011 com Alysson, 11 anos, não foi fácil. O menino havia fugido de sete abrigos e sido rejeitado pela mãe todas as vezes em que tentou voltar para casa. Quando o casal conheceu Alysson, o garoto estava há um ano na casa de uma família de testemunhas de Jeová, que tentou influenciá-lo a rejeitar a adoção. Toni conta que Alyson chegou a declarar: “Sabiam que eu tenho nojo de homossexuais?” no dia em que foram fazer uma nova carteira de identidade para o filho. Depois de vários encontros e grupos de ajuda, Alyson superou o preconceito e hoje a família tem mais dois filhos, os irmãos Jéssica, 12 anos, e Felipe, 8 anos.
Em família, Weykman e Rogério / Foto: Simone Rodrigues
Em família, Weykman e Rogério / Foto: Simone Rodrigues
As novas configurações familiares
Quando a auxiliar de produção Eva, 45 anos, e a advogada Dalia, 45, se conheceram, em 1989, o Brasil acabava de aprovar a Constituição de 1988, que define família como o resultado da união entre um homem e uma mulher ou um dos pais e seus filhos. O relacionamento entre as duas se concretizou somente em 1995, mas nada havia mudado no Brasil sobre a questão homoafetiva. O apoio da família e dos amigos, contudo, encorajou o casal a prosseguir e, em 2009, a adotar a primeira filha, Daisa. Com cinco anos na época, a menina havia sido devolvida ao orfanato por diversos outros casais. “Eles queriam alguém com paciência para não devolvê-la”, conta Dalia. Um ano depois, adotaram a segunda filha, Thamara, com 12 anos na época. Em 2013, ano da Resolução n.175, Dalia e Eva decidiram se casar. Naquele momento, o casal relata ter sentido, pela primeira vez, discriminação: o juiz negou o pedido de casamento, e Dalia e Eva entraram com um mandato de segurança. Juntas há 18 anos, tiveram que esperar mais um ano para conseguirem a permissão para casar. Conquistado o direito, tornaram-se o primeiro casal homoafetivo a casar no civil e na igreja em um mesmo ato. “Somos e sempre seremos uma família, e devem nos respeitar por isto”, afirma Dalia. O casal agora se prepara para adotar dois sobrinhos que ficaram órfãos recentemente.
O auditor fiscal Rogério Koscheck, 52 anos, e o contador Weykman Padinho, 39 anos, iniciaram o relacionamento em 2006. Oficializaram a união estável em 2013 e se casarão em breve. Desde o início, ambos tinham vontade de serem pais. “Envolvimento com outras pessoas, reprodução assistida, barriga de aluguel, adoção à brasileira, ou quaisquer outras formas de paternidade que não fosse a adoção, não eram opção”, conta Rogério. Em janeiro de 2013, o casal iniciou o processo de adoção. Um ano depois, foram indicados quatro irmãos, em Brasília. No entanto, um outro casal, já habilitado, teve a preferência legal na adoção. Um mês depois, apareceram mais quatro irmãos, dessa vez no Rio de Janeiro, com idades entre dois meses e 11 anos. Filhos da mesma mãe, todas as crianças haviam sido expostas ao vírus do HIV e passavam ou já haviam passado por tratamento. Sem preconceitos, Rogério e Weykman iniciaram a adoção em junho de 2014. O processo foi finalizado somente no começo de 2016 e hoje todas as crianças negativaram o HIV. O casal conta ter percebido que, desde que a família aumentou, vez ou outra existem olhares de surpresa quando estão em lugares públicos. “Estava na padaria do bairro em que morávamos, com minha filha mais velha. Ao indicá-la como minha filha, a atendente olhou-a de cima a baixo e disse: ‘Não pode ser!’. Retruquei: ‘Ela é minha filha!’. A mulher respondeu novamente: ‘Não pode ser, mesmo!’. Então perguntei se ela tinha filhos e indaguei: ‘Você tem completa certeza de que eles são seus?’”, lembra o auditor.
Em família, Dalia e Eva / Foto: Simone Rodrigues
Em família, Dalia e Eva / Foto: Simone Rodrigues
Rogério é um dos principais militantes pelos direitos das famílias homoafetivas e diretor da Associação Brasileira de Famílias Homoafetivas, ABRAFH. Segundo o auditor, a principal preocupação da Associação é a aprovação do Estatuto da Família. “Antes de ser aprovado, esse projeto já causou problemas até em nosso lar. Nossa filha mais velha, ao ver as reportagens a respeito, me perguntou: ‘Pai, se nossa família não é família, nós vamos ter que voltar para o abrigo?’. Essa pergunta, de uma criança de 12 anos, denota o mal que a irresponsabilidade e a desumanidade de alguns parlamentares já estão causando.”
As famílias acima estão retratadas no livro recém-lançado Nomes do amor: o amor que ousa dizer seu nome, da fotógrafa Simone Rodrigues cujo prefácio é assinado por Jean Wyllys. A obra – inspirada no trabalho da fotógrafa sul-africana Zanele Muholi, que retrata lésbicas africanas – reúne 28 famílias brasileiras homoafetivas, com ou sem filhos, biológicos ou adotados. O projeto nasceu em 2013, quando Simone sentiu incômodo diante da representação feita pela mídia do público LGBT. “O gay é sempre o homem idealizado, com o corpo como objeto de desejo, e a mulher lésbica sempre aparece junto de outra mulher, fruto de uma fantasia e fetiche masculino”, afirma Simone. “A importância de mostrar o cotidiano das famílias homoafetivas é que boa parte do preconceito é impulsionado pela ignorância. A diversidade sexual que existe no Brasil não pode viver sob os modelos ditados pelo universo hétero da sociedade conversadora, que pensa o público LGBT como uma ameaça à família tradicional. Que tipo de ameaça essas pessoas podem oferecer? Nenhuma. Elas estão vivenciando novas possibilidades de construir um núcleo familiar, tão legítimas quanto famílias hétero, já que estão baseadas no afeto e no amor para construir uma vida comum.”
A falta de dados sobre as famílias homoafetivas também é outro problema constante para a questão no Brasil. As últimas estatísticas datam de 2010, em pesquisa realizada pelo IBGE, que identificou sessenta mil casais homoafetivos no país, a maioria formada por católicos (47,4%) e mulheres (53%). Contudo, a pesquisa não abordou, por exemplo, quantos desses casais têm filhos.
Toni e David na companhia de Alyson, Jéssica e Filipe / Foto: Rafael Danielewicz
Toni e David na companhia de Alyson, Jéssica e Filipe / Foto: Rafael Danielewicz
A distância que separa a vergonha do orgulho
Dos vários convites feitos às famílias para serem retratadas no livro, Simone relata que se surpreendeu com a quantidade de recusas. “Precisava conhecer o porquê desses ‘não’. Descobri que muitas dessas famílias têm medo de se assumirem e sofrerem retaliação, principalmente no trabalho. As pessoas que tinham emprego formal, por exemplo, tinham medo de serem demitidas com a exposição do livro; as que eram autônomas, como médicos e vendedores, temiam perder os clientes”, conta. “Elas acreditam que, em um espaço público mais amplo, elas não devam existir como ‘gays’ ou ‘lésbicas’.”
O preconceito da sociedade também é um problema apontado por Berenice. “Todas as bandeiras das minorias que eu abracei tiveram muitos seguidores, mas a dos homossexuais foi quase uma luta solitária. As pessoas ainda têm medo de se manifestarem publicamente e de serem rotuladas como homossexuais”, afirma. “Elas não entendem que isso já é uma forma de discriminação”. Para a jurista, é urgente transformar a homofobia em crime no Brasil. “A Justiça consegue assegurar direitos, o que ela vem fazendo com desenvoltura e coragem, mas não consegue punir alguém por atos homofóbicos. Para se combater essa verdadeira guerra que existe contra o público LGBT – a cada 28 horas se mata um homossexual no Brasil – é necessária a existência de uma legislação adequada”, defende. Berenice explica que as propostas de lei voltadas para o público LGBT começaram a surgir no país em 1995. “Mas temos um Legislativo absolutamente covarde e até hoje não aprovamos nenhuma lei sobre o tema.”
A criminalização da homofobia está pautada no Estatuto da Diversidade Sexual, proposto por Berenice e pelas Comissões da Diversidade Sexual das Seccionais e Subseções da OAB, em 2011. Até o momento, o documento não saiu do papel. “De nada adianta apresentar propostas no Congresso se as coisas não forem adiante.” Ignorada pelo Congresso, a jurista decidiu apresentar o Estatuto como iniciativa popular. “Eu achei que seria mais fácil ir pelo caminho de angariar assinaturas, mas ainda assim é uma luta difícil, porque as pessoas não se sensibilizam pelo outro, não se colocam no lugar do outro.” Berenice chegou a caminhar pelos parques de Porto Alegre, munida de um megafone, para difundir mais rapidamente as ideias do Estatuto. Sem êxito. “Achei que seria mais rápido pela iniciativa popular, mas não é.”

Um massacre que deixa lições - Artigo de Toni Reis publicado no Jornal Gazeta do Povo

Um massacre que deixa lições - Artigo de Toni Reis publicado no Jornal Gazeta do Povo

Um massacre que deixa lições

*Toni Reis

Todos os anos a média de assassinatos de pessoas LGBT no Brasil está acima da casa dos 300, mas isso não mobiliza a opinião pública como fez o assassinato em massa ocorrido no domingo em Orlando

O que aconteceu na boate Pulse – frequentada pelo público gay, em Orlando (EUA) – na madrugada do último domingo foi o maior assassinato em massa nos Estados Unidos desde o atentado de 11 de setembro de 2001, deixando 49 pessoas mortas, mais o atirador. Seria um atentado terrorista? O grupo extremista Estado Islâmico assumiu a autoria do ataque, mas não há um elo claro entre o atirador e o grupo, apenas registro de afirmação de sua lealdade à organização extremista.
Segundo a ex-esposa, o atirador sofria de bipolaridade e era violento. O pai afirmou que o filho “ficava nervoso quando via homens se beijando”. Surgem notícias de que o assassino frequentava a boate onde houve o massacre e que utilizava aplicativos de cunho gay. Estaríamos diante de um caso grave de homofobia internalizada, ou puramente homofobia?
Há indícios de que o autor do massacre teria sido influenciado por conteúdos islâmicos fundamentalistas em circulação na internet. É sabido que a tradição islâmica condena e pune atos homossexuais em mais de 70 países, principalmente no Oriente Médio e na África, sendo que a punição pode até ser a pena de morte em sete deles. O atirador teria matado os frequentadores de uma boate gay numa tentativa de “fazer justiça” com as próprias mãos?
O extremismo e o discurso do ódio irracional cegam as pessoas
O massacre em Orlando foi um acontecimento cuja dimensão tem provocado perplexidade e manifestações de solidariedade no mundo inteiro, a exemplo da vigília realizada na noite de segunda-feira na frente do Prédio Histórico da Universidade Federal do Paraná. No entanto, a matança de homossexuais no Brasil ocorre em escala maior, só que de forma insidiosa. Até agora, no ano de 2016, já foram registrados 133 homicídios de pessoas LGBT, por motivos relacionados especificamente à sua condição sexual. Foram 319 em 2015. Todos os anos a média de assassinatos de pessoas LGBT no Brasil está acima da casa dos 300, mas isso não mobiliza a opinião pública como fez o assassinato em massa ocorrido no domingo. É assimilado como parte do quadro geral de violência e assassinatos que assola o país e se tornou banalizado.
O extremismo e o discurso do ódio irracional cegam as pessoas. Seu alvo poderia ter sido judeus, negros, evangélicos, católicos... Nesse caso, foram gays. A história tem demonstrado repetidas vezes que a intolerância, o fundamentalismo, o fanatismo e o extremismo são maléficos para a humanidade e resultam em barbárie. Basta ver o Holocausto.
A humanidade tem conhecimentos acumulados suficientes para que os conflitos possam ser resolvidos na base da diplomacia e das negociações. A racionalidade e a capacidade de conviver bem com o outro devem ser ensinadas desde a tenra idade. Temos de discutir mais o etnocentrismo – afinal de contas, o “meu” grupo, a “minha” nação não é melhor que o outro. É apenas diferente. Temos de nos aprofundar mais na interculturalidade e na alteridade, na nossa relação de interação e interdependência com o outro.
Não podemos permitir que atos bárbaros como este diminuam nossa determinação em lutar por um mundo em que as diferenças sejam respeitadas. Temos de fazer a denúncia constante dessas injustiças. Anteontem foram os palestinos e judeus, ontem foram os gays, amanhã pode ser você.
Toni Reis, pós-doutorando em Educação, é diretor-executivo do Grupo Dignidade e secretário de Educação da ABGLT.
 

As novas famílias e seus direitos

"Núcleo social de pessoas unidas por laços afetivos, que geralmente compartilham o mesmo espaço e mantém entre si uma relação solidária". Essa é a nova definição do dicionário Houaiss para o verbete "família". Essa alteração reflete as mudanças de uma sociedade que, já há algum tempo, entende que o conceito de família não se restringe a pai, mãe e filhos. Mas, no que diz respeito à legislação, as novas configurações aparecem em velocidade maior do que o Poder Legislativo poderia acompanhar, o que resulta em paradigmas no direito de família.
Para que a justiça seja feita, segundo o diretor-adjunto de Direito de Família do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Luiz Fernando Valladão, é preciso bom senso, de acordo com o contexto de cada situação. “Não dá para definir as relações de família considerando, por exemplo, se a paternidade deve ser concedida aos pais biológicos ou de acordo com as relações socioafetivas, sem analisar o conjunto”, comenta o advogado, que aposta na afetividade como um critério jurídico. Valladão lembra que o direito é uma ciência humana e não exata, portanto, tópicos além da legislação pura e simples devem ser observados.
Valladão cita a jurisprudência recente para exemplificar situações outrora atípicas, mas cada vez mais recorrentes. “No ano passado, foi reconhecido o direito de um casal homossexual de adotar uma criança. Foi uma decisão histórica e inédita da ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, que registrou no acórdão que a Constituição Federal não faz a diferenciação baseada na sexualidade”, cita o advogado. Trata-se do caso de Toni Reis e David Harrad, pais de três filhos adotivos.
“Esse tipo de decisão ainda causa espanto, mas é totalmente natural, considerando que, desde o berço, todos aqueles nomes relacionados na certidão da criança estarão em sua vida como familiares”, pondera Valladão. Ele lembra que tais decisões não beneficiam somente casais homoafetivos, mas também famílias formadas por casamentos pós-divórcio.
“Existem casos em que os padrastos criam as crianças como deles próprios e querem as garantias legais a esses, que consideram filhos; porém, os pais biológicos não precisam perder a paternidade por isso”, exemplifica o professor e advogado. Para ele, mais importante do que a configuração familiar é a manutenção dos diretos dos membros dessas famílias, sejam elas tradicionais ou não.
Livro discute desafios do direito de família
Análises de casos como o citado acima e outros, que tratam os preceitos do direito de família em face das frequentes mudanças da sociedade brasileira estão recém lançado livro “Regime de Bens – Direito de Família e Sucessões”, organizado por Luiz Fernando Valladão. Publicada pela editora Del Rey, a obra reúne artigos de 17 especialistas.
Luiz Fernando Valladão Nogueira é advogado, procurador do Município de Belo Horizonte; diretor-adjunto do Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG); professor de Direito Civil e Processo Civil na Faculdade de Direito da FEAD; professor e coordenador de Pós- Graduação na Faculdade de Direito Arnaldo Janssen; autor de diversas obras jurídicas, dentre elas "Recursos em Processo Civil" e "Recurso Especial" (ed. Del Rey); membro do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Maioria dos Planos Estaduais de Educação aprovados incluem referência à igualdade de gênero



Segundo levantamento da iniciativa De Olho nos Planos, dos 22 estados que sancionaram seus Planos, 13 incluíram menções à igualdade de gênero
Apesar de o Brasil ser um país laico, manifestações religiosas ocuparam o centro do debate sobre políticas públicas para a área educacional nos últimos dois anos. A polêmica que ganhou força nos momentos finais de tramitação dos Planos de Educação Nacional, Estaduais e Municipais se refere à inclusão ou não de metas relacionadas ao combate à discriminação e desigualdade de gênero.
De acordo com levantamento da iniciativa De Olho nos Planos, dos 22 estados que sancionaram seus Planos até janeiro deste ano, 13 incluíram menções à igualdade de gênero (Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Rondônia, Roraima, Rio Grande do Sul, Alagoas e Rio Grande do Norte).
Apesar de o estado do Rio Grande do Norte não incluir a palavra “gênero” em seu Plano, o levantamento considerou que o documento contém referência à igualdade de gênero. No texto há a determinação, por exemplo, de que os currículos escolares devem se estabelecer a partir da “perspectiva dos direitos humanos, adotando práticas de superação do racismo, do machismo, do sexismo, e de toda forma de preconceito, contribuindo para a efetivação de uma educação não discriminatória”.
Para o membro do Fórum Nacional de Educação (FNE), Toni Reis, uma das maneiras mais efetivas para reduzir a desigualdade e combater o preconceito é atuar por meio da educação formal para ensinar o respeito e a dignidade aos estudantes.
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“Há várias pesquisas que comprovam que a evasão escolar é causada também pelo preconceito, pela discriminação e pela violência, mais conhecidos como bullying. A pesquisa nacional Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar, publicada em 2009, revelou que as atitudes discriminatórias mais elevadas se relacionam a gênero (38,2%); orientação sexual (26,1%)”, citou Toni, que também é secretário de educação da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT).
E é por isso que, segundo ele, “trabalhar o respeito a todos e todas, especificando as discriminações, contribui para que os estudantes tenham prazer de estar na escola e que esta seja um lugar seguro”.
O levantamento verificou, por outro lado, que nove estados não fizeram referência à igualdade de gênero em seus documentos já sancionados (Acre, Espírito Santo, Goiás, Pernambuco, Piauí, Paraná, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins). No que diz respeito a estes estados, de acordo com o membro do FNE, continua sendo possível e necessário trabalhar com a igualdade de gênero nas políticas educacionais ainda que não esteja previsto no Plano: “a Constituição diz claramente que uma das funções do Estado é combater todas as formas de preconceito. Ainda, um dos princípios da LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional] é o respeito à liberdade e apreço à tolerância”. (Leia também: O que fazer se a igualdade de gênero não tiver sido aprovada no Plano de Educação?)
O próprio Conselho Nacional de Educação (CNE), segundo Toni, já manifestou “preocupação com Planos de Educação que vem sendo elaborados por entes federativos brasileiros e que têm omitido, deliberadamente, fundamentos, metodologias e procedimentos em relação ao trato das questões relativas à diversidade cultural e de gênero”. De acordo com nota pública divulgada no dia 1º de setembro de 2015, o Conselho defendeu a revisão dos Planos Estaduais e Municipais de Educação que não possuam metas relacionadas ao combate à discriminação e desigualdade de gênero. (Clique aqui e veja mais informações)
Como principais desafios para a garantia da educação independente do gênero ou da orientação sexual de estudantes e profissionais da educação, Toni aponta a necessidade de efetivar três principais ações: implementar a educação sobre os temas dos direitos humanos e da diversidade na formação inicial e continuada oferecida por faculdades e universidades; disponibilizar material didático-pedagógico para auxiliar os profissionais de educação na abordagem destes temas; e realizar pesquisas para o monitoramento e avaliação desse trabalho.
Segundo a plataforma Planejando a Próxima Década, do Ministério da Educação, observa-se que cinco estados ainda não sancionaram seus Planos de Educação (Bahia, Ceará, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo). De acordo com o Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado em junho de 2014, estados e municípios deveriam ter sancionado o documento até junho de 2015. Até o momento, 22 estados (81,5%) e 5462 municípios (98,06%) já sancionaram seus respectivos Planos de Educação.

Imagens: De Olho nos Planos
Reportagem: Gabriel Maia Salgado
Edição: Ananda Grinkraut
 

La familia es amor

El Grupo Dignidade -ONG desde Curitiba, Brasil- lleva adelante una campaña en defensa de la diversidad de las familias brasileñas. El hashtag #FamíliaéAmor tiene como meta visibilizar las diferentes posibilidades de tener una familia.

Conversamos con el reconocido activista, Toni Reis, director de la ONG y con Luis Fernando Pistori, secretario e integrante de la organización.

La campaña #FamiliaéAmor (http://www.familiaeamor.com.br/) tuvo inicio el día 8 de diciembre pasado, día Nacional de la Familia en Brasil y se dio en respuesta al Estatuto da Familia, un proyecto de ley que pretende delimitar la definición de familia a aquella constituida solamente por un hombre y una mujer. Esto representa una clara discriminación hacia las numerosas modalidades de familia ya existentes en el país suramericano.

El proyecto también desafía el texto mismo de la Constitución brasileña restringiendo la definición de familia aún más que la misma carta constitutiva del Brasil. La exclusión, de prosperar este proyecto, se daría no solo contra las uniones conformadas por parejas del mismo sexo -objetivos principales del proyecto- sino contra aquellas familias conformadas por madres o padres solteros u otras familias no nucleares. El Estatuto da Familia es impulsado por el presidente de la cámara de diputados, Eduardo Cunha, y un fuerte sector del poder legislativo que responde a instituciones religiosas ultraconservadoras.

No obstante, el Brasil ha declarado en sus leyes (por ej. Ley “Maria da Penha” 11.340/2006) el carácter diverso de la familia y su Constitución inclusive permite una lectura amplia. En el 2011, el Supremo Tribunal Federal (STF) ya había extendido la definición de familia a aquellas conformadas por parejas del mismo sexo.

Las respuestas al proyecto de ley conservador no se hicieron esperar. En el senado se encuentra otro proyecto denominado Estatuto das Familias, en plural, el cual no especifica el sexo de las personas que integran el núcleo familiar. Y se encuentra así mismo la campaña Familia é Amor que tiene como propósito echar luz sobre la diversidad de las familias brasileñas, sean estas homoparentales, heterosexuales, divorciadas, sin hijos, etc.


Democratizar la familia
El Grupo Dignidade, organización civil del estado de Paraná para la defensa de los DDHH de las personas LGBT, es la responsable de la campaña a nivel país. Su director ejecutivo, Toni Reis, junto con el presidente, David Harrad, constituyen la primera pareja gay que consiguió el derecho de casarse legalmente en Brasil. La pareja adoptó tres niños: Felipe (10), Jessica (12) y Alyson (15).

“Según el académico alemán Petzold, existen 196 tipos de familias. Nosotros somos un tipo de familia más. No existe un solo modelo de familia, aquel tradicional de hombre y mujer y niños. Existen muchas maneras de construir familias y nosotros somos una” nos explica Toni Reis (51) reconocido activista a nivel internacional por los derechos LGBT. “La familia es amor, son lazos. Las familias constituidas por abuelos-nietos, madre soltera-hijo, tíos-sobrinos son también familias y existen muchas otras. Definir familia de una sola manera discriminará a todas las otras construcciones de familias.” afirma Reis.

Toni asegura que él y su esposo David Harrad conforman una familia tradicional: “A nosotros nos gusta usar las alianzas, tenemos todos los papeles en regla, tenemos una casa, tenemos hijos que van a la escuela, vamos al consejo escolar, nuestros hijos son scouts. Nos vamos de picnic, también vamos al parque. Somos cristianos: yo soy católico y mi marido es anglicano. Somos una familia.”

En cuanto a la posibilidad de acoso escolar (bullying) a los niños de la pareja, Toni nos comenta: “Al matricular a los niños por primera vez en la escuela, nos presentamos a la dirección, al equipo pedagógico y a los profesores y dijimos 'nosotros somos gays y tenemos hijos y no aceptaremos la discriminación ni bullying ni prejuicio y si hubiera, vamos a procesar a la escuela'. Los niños hasta ahora no tuvieron problemas porque están fortalecidos emocional y psicológicamente.”

“Nosotros les enseñamos a decir a nuestros hijos, si encuentran alguna situación de discriminación,: 'nuestros padres son gays, ¿y qué?'. Siempre les decimos para contestar así: '¿y qué?, ¿algún problema?, ¿qué quieres?'”

“Nuestra familia es protagonista de nuestra historia: somos muy visibles. La visibilidad de nuestra situación hace que las personas nos respeten. El Ministerio Público, los jueces, los abogados, la prensa, todos saben nuestra situación.”

No estamos en contra de la familia. No estamos en contra de la familia tradicional. Nosotros estamos a favor del respeto a todos los tipos de familias. No queremos destruir la familia de los otros, nosotros queremos construir la nuestra. -Toni Reis

Toni finaliza en que es importante democratizar las palabras: “Las palabras dan mucho poder. Es importante no privatizarlas. Y 'familia' es una palabra muy fuerte así como 'Dios' u otros. Y en vez de privatizar diciendo por ejemplo 'Dios es mío', debemos decir 'Dios es de todos'. Tenemos que democratizar los conceptos”.

Cambiar la visión desde la sociedad
Luis Fernando Pistori, secretario de Salud y Educación de la ONG Grupo Dignidade, señala “Queremos cambiar la sociedad a partir de las búsquedas de Google. Queremos que, cada persona, al buscar en internet la palabra “familia” vea diferentes modelos de familia aparte del heterosexual”.

“Queremos mostrar a diferentes parejas: parejas gay y lesbianas, madres solteras, etc. Una parte del gobierno quiere ahora imponer qué es una familia” afirma el secretario del Grupo Dignidade. “Nuestro Estado es laico, es decir, está separado de toda religión” comenta Luis Fernando.

“Nuestro congreso tiene un fuerte componente conservador y es complicado para las personas LGBT hacer frente a esto. Por eso es que intentamos cambiar la visión de la sociedad primero. Si cambiamos la sociedad, la comunidad, podremos cambiar al gobierno.” nos explica el activista.

A futuro, la campaña tiene planeado extenderse por todo Brasil y, en algún momento, expandirse a América Latina entera.

La familia no es solo sangre. La familia es amor. Queremos mostrar que el amor está sobre todo. Una madre soltera con su hijo es una familia, los amigos son también familia. Todas las clases de familias son familia. -Luis Fernando Pistori

Las familias están constituidas por lazos diversos que superan toda orientación sexual, clase social e inclusive sangre. Y esta campaña tiene como propósito partir desde la realidad, reconociendo y respetando la diversidad ya existente en la sociedad, conformada no por un solo modelo de familia sino por varios tipos de familias.

Fotografía: NINJA y Natalia Godoy para MANGO Estudio.

Norma Flores Allende

Redactora, SOMOSGAY.


A comunidade LGBT no foco da discussão



“Todo debate acrescenta conhecimento, gera ações e cria iniciativas”. É com este propósito que o professor Toni Reis ministra uma palestra durante a segunda edição do SIM - Semana da Diversidade Sexual - que acontecerá em Araçatuba. Entre os temas abordados está o movimento LGBT no Brasil, abordando seus avanços e desafios. Segundo Toni, a violência contra a comunidade LGBT pode ser combatida através da denúncias, processos judiciais e repressão, mas principalmente, através da educação para o respeito à diversidade humana.
Mesclando relatos pessoais e apresentando dados e informações, a ênfase do encontro serão questões como a homofobia, transfobia e violência. Toni Reis é graduado em Letras, especialista em Sexualidade Humana, mestre em Filosofia e doutor em Educação. É secretário de Educação da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) e Diretor Executivo do Grupo Dignidade.
Em entrevista a EOnline, o professor compartilha seus conhecimentos sobre a comunidade LGBT, destacando o cenário político que nos encontramos atualmente. Ele também conta sobre como aconteceu o processo de adoção de seus três filhos.

EOnline: Quando começou a estudar a temática LGBT?
Toni Reis: Desde os 14 anos quando me assumi gay, comecei a ler a respeito. Sempre procurei me aprofundar no tema. No curso de letras, reuníamos informalmente em um pequeno grupo de pessoas para discutir o tema. Depois de formado, tive a oportunidade de morar quatro anos na Europa. De volta ao Brasil, em 1992 fundamos o Grupo Dignidade, o primeiro grupo paranaense LGBT. Fiz especialização em sexualidade humana e no mestrado me concentrei em ética e sexualidade. No doutorado focalizei na questão da homofobia e transfobia na educação e agora estou continuando meus estudos na mesma área no pós-doutorado. O que me motivou foi o sofrimento que passei dos 14 aos 21 anos de idade. Fui tratado como doente, pecador e "criminoso", por não ser hetero. Eu tenho lutado pelos direitos da população LGBT para que outras pessoas não passem pelo que eu passei só por causa de uma orientação sexual diferente da heteronorma.

EOnline: Como o movimento LGBT está sendo desenvolvido no Brasil? Quais os pontos positivos? E quais os negativos?
Toni Reis
: Em 1992 havia em torno 15 grupos LGBT em todo o Brasil. Hoje há mais de 400. Ou seja, houve um desenvolvimento relativamente rápido. Naquela época, não havia paradas LGBT, hoje há em torno de 250 eventos de visibilidade dentro da temática. Não existiam políticas públicas e nem um canal de diálogo com o governo. Hoje tem. Outro ponto positivo é que com o advento das mídias sociais, houve uma diversificação da militância, o que é positivo. O principal ponto negativo é o avanço concomitante do fundamentalismo religioso e a forma como trata as pessoas LGBT.

EOnline: Quais os desafios ainda precisam ser enfrentados pelo movimento?
Toni Reis:
 Os principais desafios são a apresentação de aprovação no Congresso Nacional de leis que promovam a proteção jurídica da população LGBT, em especial a criminalização da homofobia em pé de igualdade com o racismo, políticas públicas afirmativas no Executivo, bem como decisões favoráveis à cidadania das pessoas LGBT no Judiciário. A minha sugestão para este enfrentamento é muito trabalho para as pessoas LGBT, ampliando alianças com vários setores da sociedade. A união faz a força.

EOnline: A homofobia, transfobia e o preconceito ainda são muito frequentes em nossa sociedade. Por que você acredita que as pessoas utilizam a violência para resolver estas situações?
Toni Reis:
 Há várias pesquisas que demonstram a intolerância relativa à diversidade sexual. Por exemplo, a pesquisa “Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar” (2009) mostrou que 87,3% dos/das entrevistados/as consideram que têm atitudes preconceituosas em relação à orientação sexual dos outros. A pesquisa “Juventudes e Sexualidade” (2004) mostrou que 40% dos estudantes masculinos não gostariam de estudar na mesma sala de aula com um gay. De atitudes preconceituosas precisa apenas um pequeno passo até chegar à discriminação e à violência para atacar aquilo que é diferente do convencionalmente aceito. A violência sempre existiu, só que agora ela está mais explícita. Antes as pessoas ficavam caladas, hoje muitas denunciam. A violência pode ser combatida através da denúncia, processos judiciais, repressão e principalmente, através da educação para o respeito à diversidade humana.

EOnline: Como os políticos e autoridades tem tratado o movimento LGBT? Faltam políticas públicas nesta área?
Toni Reis:
 Em geral, nós temos conquistado muitos direitos, mas ainda há muito preconceito por parte de setores fundamentalistas ligados à igrejas que não têm conhecimento a respeito da diversidade sexual e que se utilizam da nossa vulnerabilidade para se promoverem com distorções, prejulgamentos e ofensas. Creio que faltam políticas públicas mais efetivas de promoção do respeito a todos e todas, com ênfase nas pessoas LGBT, mulheres, negros e negras, população de rua, indígenas, entre outras minorias sociológicas.

EOnline: Atualmente você é pai de três filhos. Como foi o processo de adoção deles? Ainda é um processo muito complicado?
Toni Reis:
 O processo de adoção foi bastante complicado, não a adoção e convivência com os filhos em si, mas os trâmites legais e burocráticos. Demos entrada em 2005 para adoção conjunta e só conseguimos adotar o primeiro filho em 2011/2012. Tivemos que ir até o Supremo Tribunal Federal (STF) para ter o direito de adoção garantido. Do início ao fim, levou 10 anos desde o pedido de qualificação para adoção em 2005 até a decisão final do STF em 2015. Graças ao reconhecimento da união estável homoafetiva em 2011 e graças a uma juíza sensibilizada em outra comarca que não a comarca em que iniciamos o processo, conseguimos adotar sem ter que aguardar a decisão final do STF.

EOnline: Como foi a reação dos seus filhos ao serem adotados?
Toni Reis: 
Todos ficaram felizes para terem novamente uma família, depois de terem sido separados de suas famílias biológicas e passarem por abrigos e famílias acolhedoras. O primeiro filho adquiriu vários preconceitos nos abrigos pelo qual passou, inclusive contra homossexuais. Então, precisou um período de ajuste até que ele percebeu que o que havia aprendido de ruim a respeito de gays não correspondia à realidade. Os outros dois filhos se adaptaram de forma muito tranquila. Temos um diálogo muito aberto entre nós e isso tem facilitado à adaptação.

EOnline: Como você se articula na luta pelo movimento LGBT?
Toni Reis:
 Antes mesmo de ir para a Europa, quando ainda estudante na UFPR, comecei a me aproximar do então chamado Movimento Homossexual Brasileiro (MHB). Na Europa o movimento LGBT estava muito mais avançado e aprendi muito. Voltei para o Brasil e fundamos o Grupo Dignidade. Já no primeiro estatuto uma das finalidades era organizar os grupos LGBT brasileiros em uma “confederação”. Sentíamos a necessidade de ter uma entidade LGBT nacional representativa que pudesse se articular com as instâncias federais, para que houvesse avanços com os direitos humanos de LGBT. Após um período de articulação em 1993 e 1994, foi fundada em Curitiba a ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Eu fui o primeiro presidente da ABGLT e ocupei o cargo novamente entre 2007 e 2012. Na minha gestão a ABGLT ganhou status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC) das Nações Unidas, sendo a primeira organização LGBT do hemisfério sul a adquirir esse status. Hoje sou secretário de educação da ABGLT.

EOnline: O que emperra o debate LGBT no Brasil?
Toni Reis:
 Principalmente o fundamentalismo e o extremismo religioso e seus representantes nas casas legislativas.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Maioria dos Planos Estaduais de Educação (13) aprovados incluem referência à igualdade de gênero


Para conhecimento, divulgação e mobilização nos estados SP,RJ, MG, BA e CE. 
Vamos redobrar os esforços pela respeito a todos e todas. 
Toni Reis 
Pós-doutorando em Educação - Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos 

Bolsista da CAPES 

Membro Titular do Fórum Nacional, Estadual (Paraná) e Municipal (Curitiba) de Educação 

Secretário de Educação da ABGLT 

Diretor de Relações Internacionais UNALGBT 

Comitê Executivo da Rede Gaylatino 

Diretor Executivo - Grupo Dignidade/CEPAC/IBDSEX 

http://lattes.cnpq.br/6056553002895088 

Maioria dos Planos Estaduais de Educação aprovados incluem referência à igualdade de gênero 
Segundo levantamento da iniciativa De Olho nos Planos, dos 22 estados que sancionaram seus Planos, 13 incluíram menções à igualdade de gênero 

Apesar de o Brasil ser um país laico, manifestações religiosas ocuparam o centro do debate sobre políticas públicas para a área educacional nos últimos dois anos. A polêmica que ganhou força nos momentos finais de tramitação dos Planos de Educação Nacional, Estaduais e Municipais se refere à inclusão ou não de metas relacionadas ao combate à discriminação e desigualdade de gênero. 

De acordo com levantamento da iniciativa De Olho nos Planos, dos 22 estados que sancionaram seus Planos até janeiro deste ano, 13 incluíram menções à igualdade de gênero (Amazonas, Amapá, Distrito Federal, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Rondônia, Roraima, Rio Grande do Sul, Alagoas e Rio Grande do Norte). 

Apesar de o estado do Rio Grande do Norte não incluir a palavra “gênero” em seu Plano, o levantamento considerou que o documento contém referência à igualdade de gênero. No texto há a determinação, por exemplo, de que os currículos escolares devem se estabelecer a partir da “perspectiva dos direitos humanos, adotando práticas de superação do racismo, do machismo, do sexismo, e de toda forma de preconceito, contribuindo para a efetivação de uma educação não discriminatória”. 

Para o membro do Fórum Nacional de Educação (FNE), Toni Reis, uma das maneiras mais efetivas para reduzir a desigualdade e combater o preconceito é atuar por meio da educação formal para ensinar o respeito e a dignidade aos estudantes. 

“Há várias pesquisas que comprovam que a evasão escolar é causada também pelo preconceito, pela discriminação e pela violência, mais conhecidos como bullying. A pesquisa nacional Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar, publicada em 2009, revelou que as atitudes discriminatórias mais elevadas se relacionam a gênero (38,2%); orientação sexual (26,1%)”, citou Toni, que também é secretário de educação da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). 

E é por isso que, segundo ele, “trabalhar o respeito a todos e todas, especificando as discriminações, contribui para que os estudantes tenham prazer de estar na escola e que esta seja um lugar seguro”. 

O levantamento verificou, por outro lado, que nove estados não fizeram referência à igualdade de gênero em seus documentos já sancionados (Acre, Espírito Santo, Goiás, Pernambuco, Piauí, Paraná, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins). No que diz respeito a estes estados, de acordo com o membro do FNE, continua sendo possível e necessário trabalhar com a igualdade de gênero nas políticas educacionais ainda que não esteja previsto no Plano: “a Constituição diz claramente que uma das funções do Estado é combater todas as formas de preconceito. Ainda, um dos princípios da LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional] é o respeito à liberdade e apreço à tolerância”. (Leia também: O que fazer se a igualdade de gênero não tiver sido aprovada no Plano de Educação?) 

O próprio Conselho Nacional de Educação (CNE), segundo Toni, já manifestou “preocupação com Planos de Educação que vem sendo elaborados por entes federativos brasileiros e que têm omitido, deliberadamente, fundamentos, metodologias e procedimentos em relação ao trato das questões relativas à diversidade cultural e de gênero”. De acordo com nota pública divulgada no dia 1º de setembro de 2015, o Conselho defendeu a revisão dos Planos Estaduais e Municipais de Educação que não possuam metas relacionadas ao combate à discriminação e desigualdade de gênero. (Clique aqui e veja mais informações) 

Como principais desafios para a garantia da educação independente do gênero ou da orientação sexual de estudantes e profissionais da educação, Toni aponta a necessidade de efetivar três principais ações: implementar a educação sobre os temas dos direitos humanos e da diversidade na formação inicial e continuada oferecida por faculdades e universidades; disponibilizar material didático-pedagógico para auxiliar os profissionais de educação na abordagem destes temas; e realizar pesquisas para o monitoramento e avaliação desse trabalho. 

Segundo a plataforma Planejando a Próxima Década, do Ministério da Educação, observa-se que cinco estados ainda não sancionaram seus Planos de Educação (Bahia, Ceará, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo). De acordo com o Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado em junho de 2014, estados e municípios deveriam ter sancionado o documento até junho de 2015. Até o momento, 22 estados (81,5%) e 5462 municípios (98,06%) já sancionaram seus respectivos Planos de Educação. 

Imagens: De Olho nos Planos 

Reportagem: Gabriel Maia Salgado 

Edição: Ananda Grinkraut 

http://www.deolhonosplanos.org.br/maioria-dos-planos-estaduais-de-educacao-aprovados-incluem-referencia-a-igualdade-de-genero/