sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Por um Plano Nacional de Educação inclusivo

Por um Plano Nacional de Educação inclusivo

  • Toni Reis
Texto publicado na edição impressa de 08 de abril de 2014
Após vários adiamentos, uma comissão especial da Câmara dos Deputados deve votar hoje o projeto de lei do Plano Nacional de Educação para os próximos dez anos. Entre outras disposições inclusivas, o artigo 2.º da versão do projeto enviada pela Câmara para apreciação pelo Senado – que, inclusive, se baseou nas deliberações democraticamente elaboradas e aprovadas pela Conferência Nacional de Educação de 2010 – prevê: "São diretrizes do PNE (...) a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual e na erradicação de todas as formas de discriminação". Esta versão do projeto também prevê a flexão de gênero em sua redação (ex. os/as professores/as) com vistas à promoção da igualdade de gênero.
Contudo, o Senado aprovou um substitutivo com alterações. O artigo 2.º perdeu a exemplificação dos tipos de discriminação mais comuns, mantendo apenas a disposição genérica contra "todas as formas de discriminação". Isto apesar dos achados de várias pesquisas em relação à discriminação no ambiente escolar, como a da Fipe/MEC/Inep, que revelou que as atitudes discriminatórias mais elevadas se relacionam a gênero (38,2%), orientação sexual (26,1%), étnico-racial (22,9%) e territorial (20,6%). Esses dados indicam precisamente por que a versão original do artigo 2.º do projeto tem a redação acima.
Na sociedade em geral, essas atitudes se extrapolam além da mera discriminação: 26% dos brasileiros acham que mulher de roupa curta merece ser atacada, segundo o Ipea; em 2010 houve 34.983 homicídios de pessoas negras no país. Em 2012, o governo federal recebeu 9.982 denúncias de violação dos direitos humanos de pessoas LGBT. Esses dados apontam para a premente necessidade de especificar e enfrentar essas e outras formas de discriminação. Este processo precisa começar por um sistema de educação inclusiva.
Em relação à reflexão de gênero, o substitutivo do Senado requer a "supressão, em todo o texto, da flexão de gênero, adotando a forma genérica masculina". Essa disposição perpetuará o machismo. E mais: insistir em usar apenas a forma masculina é um desrespeito às mulheres, que são a esmagadora maioria dos/das profissionais de educação no Brasil.
Há quem já tenha declarado publicamente, em relação ao PNE, que a mulher tem de permanecer numa condição inferior e subordinada ao homem. Outros veem nas disposições propostas no PNE acerca de gênero e orientação sexual uma afronta à instituição da família, porque se recusam a enxergar a realidade das múltiplas formas de família, identificadas inclusive pelo último censo.
É preciso fazer cumprir o que a Constituição estabelece: que todas as pessoas são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, que a educação é um direito de todos e todas, devendo ser garantida a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, e que tanto o Estado quanto a educação pública são laicos. Acima de tudo, é nestes princípios que a proposta original do PNE se baseou na tentativa de garantir a educação inclusiva. Isto deve ser respeitado e sua redação original deve ser mantida, se queremos acabar com o triste quadro de desigualdade, discriminação e homicídios retratado acima.
Toni Reis, doutor em Educação, é membro integrante dos fóruns Nacional, Estadual (Paraná) e Municipal (Curitiba) de Educação.

Respeito na família, escola e sociedade

Respeito na família, escola e sociedade


Nas discussões sobre os Planos Estaduais e Municipais de Educação, espraiou-se uma falácia que, de tanto ser repetida, se transformou em verdade para quem segue de forma acrítica os semeadores dessa mentira deslavada.
A falácia recebeu o nome de "ideologia de gênero" e suas principais alegações são as de que há uma conspiração internacional que, por meio da educação, quer "perverter" as crianças, ensiná-las a ser gay e destruir a família tradicional.
Existe, sim, uma ideologia de gênero, mas não é essa que usurpou seu nome e distorceu seus objetivos.
O "Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil: Ano de 2012", publicado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, revela que naquele ano houve 9.982 denúncias de violações dos direitos humanos de pessoas LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), bem como pelo menos 310 homicídios de LGBT no país.
A Pesquisa sobre Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar (2009), do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), em uma amostra nacional de 18,5 mil estudantes, pais e mães, diretores, professores e funcionários, revelou que as atitudes discriminatórias mais elevadas se relacionam a gênero (38,2%); orientação sexual (26,1%); étnico-racial (22,9%); e territorial (20,6%).
Esses dados mostram que o Brasil enfrenta graves problemas de machismo, sexismo, racismo, homofobia, discriminação e violência. Não é censurar os Planos de Educação que vai resolver o problema, isto só vai garantir sua persistência.
Nos fóruns de discussão sobre os Planos Estaduais e Municipais de Educação --os quais deverão ser aprovados na forma de leis até 24 de junho de 2015-- foram retomadas as deliberações dos sete eixos da Conae (Conferência Nacional de Educação) 2014, que abarcaram medidas para promover a igualdade na educação para os grupos da sociedade mais atingidos por injustiças.
São meninas e mulheres, pessoas com deficiência e necessidades especiais, pessoas negras, quilombolas, indígenas e de outras raças e etnias, pessoas LGBT, ciganos, e povos do campo, da floresta, itinerantes e das águas, entre outros.
No entanto, em muitos casos, quando as propostas de Planos de Educação chegaram nas casas legislativas para serem transformadas em lei, esbarram com uma cruzada fundamentalista e medieval contra a "ideologia de gênero".
Embora o furor e a histeria se centrassem na questão LGBT, na família e nas mulheres, acabou atingindo os demais setores sociais, raças e etnias, transformando-se em uma alarmante intolerância à diversidade humana e uma preocupante imposição antidemocrática de valores que chegam a ser fascistas.
Se há uma ideologia, deveria ser a do respeito, da pluralidade, da não violência, de poder viver em paz. Para essa discussão, precisamos ter serenidade, racionalidade, lógica, dados e paciência para escutar todos os lados. Não existem soluções binárias e dualistas para questões complexas.
Algumas das escolas brasileiras são do século 19, alguns/algumas professores(as) são do século 20, os/as estudantes são do século 21 e alguns/algumas dos/das legisladores(as) são da Idade Média.
Nossa discussão é a dignidade humana, nossa demanda é pelo respeito, não queremos destruir a família de ninguém, queremos o respeito para todas as famílias.

Reportagem - Debate sobre conceito de família opõe ativista e pastor na Câmara

Reportagem - Debate sobre conceito de família opõe ativista e pastor na Câmara


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Em um debate acalorado na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (25) o pastor Silas Malafaia, líder da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, e o ativista de direitos humanos e do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis) Toni Reis divergiram sobre o conceito de família e defenderam a aprovação de projetos de lei para restringir ou para ampliar a definição sobre o núcleo familiar.
A audiência foi realizada pela comissão especial que discute o projeto de lei para a criação do Estatuto da Família.
Primeiro a falar na audiência, Toni Reis defendeu o reconhecimento das famílias homossexuais e pediu respeito à comunidade LGBT. "No Estado de direito, as opiniões podem ser diferentes e contrárias mas é preciso ter respeito", pediu. "Ninguém em sã consciência é contra a família. Todos nós nascemos de uma família. Não somos filhos de chocadeira. Nascemos de uma família. Mas é preciso conceituar e é nisso que podemos ter divergências", completou.
Ele defendeu que haja o Estatuto das Famílias com a inclusão da união entre pessoas do mesmo sexo. "O que nos separa aqui é o senhor colocar a família como uma entidade única e constante no tempo pode ser mais um pré-julgamento do que uma realidade", disse a Malafaia.
Em seguida, Malafaia iniciou sua fala recorrendo à Constituição para explicar o conceito que defende de família. Para ele, enquanto o texto constitucional trouxer o conceito de casamento entre um homem e uma mulher, o Estado brasileiro precisa respeitar este tipo de formação familiar.
"Vou sugerir que o movimento LGBT faça uma PEC [Proposta de Emenda à Constituição] para retirar da Constituição brasileira que a entidade familiar é homem e mulher. O resto é bravata e canetada para derrubar o que esta aqui", disse. Ele criticou ainda a decisão do Supremo Tribunal Federal de autorizar a união estável entre pessoas do mesmo sexo. "O STF não legisla coisa nenhuma. Isso é uma afronta ao Parlamento", disse.
O pastor reclamou que existe um "jogo de interesses" em que a "maioria é submetida a caprichos da minoria". "O jogo é ideológico, é muito mais profundo. Que democracia é essa? Que Estado é esse onde a minoria infringe a maioria?", esbravejou.
Em seguida, Malafaia afirmou que o governo deve ser laico mas a política não. "Estado laico é o governo. O Parlamento não é laico porque ele representa o povo. Nenhum debate político pode se descartar das crenças de uma pessoa. A sociedade ocidental é permeada em seus costumes pelo modelo judaico-cristão", defendeu.
Uma claque ligada a igrejas evangélicas do Distrito Federal acompanhou a audiência e se manifestou efusivamente em diversos momentos com cartazes, gritos e batidas nas mesas do plenário da Câmara.
Durante o debate, os deputados da bancada evangélica reclamaram dos protestos feitos durante a Parada Gay de São Paulo, realizada no fim de maio, em que símbolos cristãos foram usados. Eles também criticaram o que chamam de "ativismo gay" de tentar incutir no ensino fundamental do país uma política de identidade de gênero para influenciar as crianças.
Única deputada não integrante da bancada evangélica na comissão, Érika Kokay (DF) criticou o projeto debatido pelo colegiado e afirmou que a família se caracteriza por relações amorosas e permanentes, independente do sexo das pessoas que as formam.
"O projeto joga no limbo famílias que se construíram e que são fundamentais para a formação do ser humano. Tentar associar a comunidade LGBT à doença, a traumas ou à pedofilia significa construir uma relação de ódio e exclusão para essas pessoas", disse.
"Queremos construir uma cultura de paz para que todo ser humano possa exercer sua humanidade. Se queremos uma sociedade sem violência, vamos respeitar o beijo, o afeto e as diversas formas de família. Quem rechaça o afeto, tende a naturalizar a violência", completou.
Composta por deputados da bancada evangélica e católica da Casa, a comissão discute uma proposta que restringe o conceito de família para apenas a união entre um homem e uma mulher e pede a promoção de políticas públicas que valorizem a instituição familiar. A criação da comissão foi autorizada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também evangélico, em fevereiro.
QUEBRA DE PROTOCOLO
Mesmo tendo assumido o compromisso de respeitarem as opiniões divergentes durante a audiência, alguns deputados quebraram o protocolo ao fazerem piadas e ironias. "Vossa Excelência faz xixi? Faz no banheiro feminino ou masculino? Sei que faz no masculino e não tem problema nenhum fazer do meu lado, mesmo sem divisória", disse o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que já havia contado ter sido chamado de sogro por Toni Reis antes do início da audiência.
Em seguida, seu filho, o deputado em primeiro mandato Eduardo Bolsonaro (PSC-SP), se levantou e acenou ao plenário. "Seria um desperdício, não é?", ironizou o pai, sendo aplaudido pela plateia que acompanhava a sessão.
Em resposta, entrando na brincadeira, Toni Reis afirmou: "temos que amar o próximo, e se for bonito, temos que amar ainda mais".
Já o deputado Flavinho (PSB-SP) tentou explicar como se dá o início do casamento. "A família não começa com um beijo. Ela começa com o encontro entre uma vagina e um pênis. Desculpem-me ter que usar esses termos, mas é assim", disse, provocando risos na plateia.
O próprio Malafaia ironizou o movimento LGBT ao repetir reiteradas vezes que o texto da Constituição sobre o conceito de família é claro. "Não é possível que não entendam. Isso aqui não é francês e não é alemão. Vou ler de novo para ver se escutam", disse com a Carta Magna na mão

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Um pouco da história da ABGLT


 
Um pouco da história da ABGLT

A atual missão da ABGLT é: “Promover ações que garantam a cidadania e os direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, contribuindo para a construção de uma sociedade democrática, na qual nenhuma pessoa seja submetida a quaisquer formas de discriminação, coerção e violência, em razão de suas orientações sexuais e identidades de gênero”. Neste sentido, a associação desempenha um papel de representação destes segmentos e articulação junto ao Executivo, ao Legislativo e ao Judiciário, visando cumprir sua missão.

Em relação à criação da ABGLT, a Plenária Final do VII Encontro Brasileiro de Lésbicas e Homossexuais, realizado no Instituto Cajamar (São Paulo) entre 4 e 7 de setembro de 1993, decidiu pela “constituição de uma Comissão (Rede/Associação) Brasileira de Direitos Humanos para Gays e Lésbicas”.

No decorrer do ano de 1994 foram realizadas tarefas, como a elaboração do estatuto e da carta de princípios (www.abglt.org.br/port/cartaprinc.php), e houve uma reunião presencial preparatória com participação expressiva em Curitiba nos dias 30 e 31 de julho daquele ano.

A fundação da organização, que foi batizada com o nome “Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis – ABGLT”, ocorreu em 31 de janeiro de 1995, durante o VIII Encontro Brasileiro de Gays e Lésbicas, na cidade de Curitiba. A associação teve 31 grupos fundadores, sendo a maioria das organizações LGBT existentes na época.

A formação de ABGLT representou um marco importante na história do movimento LGBT brasileiro porque possibilitou a criação de uma instância de abrangência nacional de representação com capacidade e legitimidade para levar as reivindicações do segmento até o Governo Federal, o que até então havia sido impossível. Foi uma estratégia que, ao mesmo tempo, ajudou o movimento LGBT a se organizar no país e também deu uma voz a um segmento da sociedade tradicionalmente marginalizado, contribuindo assim para a promoção de seus direitos humanos.

A ABGLT tem cumprido o papel de representação nacional e de organização do movimento. Quando de sua fundação em 1995 havia menos de 40 grupos LGBT em todo o Brasil. Hoje tem mais de 300. Não havia nenhuma parada LGBT, hoje tem mais de 250, muitas em cidades do interior. Hoje há políticas públicas para LGBT, com uma Coordenação LGBT dentro da estrutura da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, e o Conselho Nacional LGBT com representação paritária do governo e da sociedade civil. A ABGLT não conseguiu tudo isso sozinha, mas sempre esteve à frente desse processo.

Além dos direitos humanos, a ABGLT também tem tido atuação na área do enfrentamento da epidemia do HIV e Aids. Juntos a ABGLT e o Programa Nacional, após um desafio lançado pelo então coordenador Dr. Pedro Chequer no IX EBGLT em 1997 em São Paulo, construíram o Projeto Somos no final dos anos 1990. Começando como um projeto piloto com 4 grupos gays capacitando outros grupos incipientes nos temas de desenvolvimento organizacional, prevenção e advocacy, no seu auge por volta de 2005/2006, o projeto chegou a abranger 270 grupos em 220 municípios em todas as regiões do país.

A ABGLT participou ativamente na construção conjunta (com o Governo Federal) do Programa Brasil Sem Homofobia, lançado em 2004 com 53 ações voltadas para a promoção da cidadania da população LGBT. Depois do lançamento do Programa, a ABGLT atuou com presença marcada durante os dois mandatos do presidente Lula, realizando ações de advocacy no Congresso Nacional e junto aos Ministérios.  Essa atuação contribuiu para vários avanços com as políticas públicas afirmativas para LGBT e a ABGLT foi entre as organizações da sociedade civil que participou da organização da 1ª Conferência Nacional LGBT em 2008. Um marco na história mundial.

Na área da educação, um desdobramento do Programa Brasil Sem Homofobia foi a aprovação de uma emenda parlamentar articulada pela ABGLT no final de 2007, que permitiu o desenvolvimento do Projeto Escola Sem Homofobia, em parceria com várias organizações de renome, bem com o próprio Ministério da Educação. O Projeto teve vários produtos, incluindo: a realização um seminário em cada região do país a fim de obter um perfil da situação da homofobia na escola a partir da realidade cotidiana dos envolvidos; a realização de uma pesquisa qualitativa sobre homofobia na comunidade escolar em 11 capitais das 5 regiões do país; e a criação de um conjunto de materiais educativos com conteúdos teóricos e sugestões de atividades que ajudam a identificar e erradicar a homo-lesbo-transfobia do ambiente escolar, direcionado para gestores(as) e educadores(as). Como resultado de pressão de parlamentares fundamentalistas religiosos, os materiais educativos foram suspensos pela presidenta da república em maio de 2011. Apesar de não ter sido aplicado pelo Governo Federal, foi mobilizada uma grande discussão sobre a educação no país e o material foi divulgado pela Nova Escola com milhares de downloads, o que superou em muito a quantidade que o governo iria imprimir.

Em 27 de julho de 2009 a ABGLT ganhou status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC) das Nações Unidas. A ABGLT foi a primeira organização LGBT nas Américas a receber o status consultivo.  Esse status garante as organizações da sociedade civil a participação nos eventos das Nações Unidas, bem como poder falar em seu próprio nome durante as atividades que participa.  A participação efetiva das organizações LGBT, como a ABGLT tem feito, tem contribuído  de forma decisiva para a ampliação da atenção dada pela ONU à violação de direitos humanos e à discriminação por orientação sexual e identidade de gênero que ocorre pelo mundo.A ABGLT tem participado de vários encontros junto ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas; a Organização Mundial de Saúde; a Organização Pan-Americana de Saúde; a UNESCO; a UNICEF, a UNAIDS, etc. contribuindo na elaboração de documentos e consultas sobre a relação da população LGBT e os temas discutidos por cada uma das agencias (saúde, educação, trabalho, direitos humanos, entre outras).

A ABGLT foi amicus curiae no Supremo Tribunal Federal em relação da Arguição de Descumprimento de Preceito Constitucional nº 132, promovida pelo governo do estado do Rio de Janeiro; e a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4277,  interposta pela Procuradoria-Geral da República, ambas sobre o reconhecimento da união estável homoafetiva. Por diversas vezes a ABGLT teve audiências com ministros(as) do STF, prestando esclarecimentos. Em 5 de maio de 2011, o STF reconheceu unanimemente o direito à equiparação da união homoafetiva à união estável entre casais do mesmo sexo.

A ABGLT tem como prioridade a criminalização da discriminação e da violência motivadas por orientação sexual e identidade de gênero e vem apoiando constantemente proposições no legislativo e no judiciário voltadas para esta finalidade.

Periodicamente desde 2005, a ABGLT realiza Congressos onde aprova teses a defina suas prioridades de atuação para o próximo período. O 5º Congresso da ABGLT foi realizado em Niterói em 2014.

No decorrer de sua história, a ABGLT tem tido representação em instâncias nacionais de controle e participação social. Atualmente tem representação no Conselho Nacional de Saúde, Conselho Nacional de Segurança Pública, Conselho Nacional LGBT, Conselho Nacional de Direitos Humanos, Conselho Nacional de Juventude, no Fórum Nacional de Educação e na Comissão de Articulação com os Movimentos Sociais do Departamento Nacional de DST, Aids e Hepatites do Ministério da Saúde.

A ABGLT já foi reconhecida por sua atuação, tendo recebido, entre outros, o Prêmio de Direitos Humanos do Governo Federal em 2007, a Ordem do Mérito Cultural em 2008, o Prêmio Aliados e o Prêmio Arco-Íris.

Hoje a ABGLT hoje a ABGLT é uma rede consolidada com 308 entidades LGBT e congêneres afiliadas.

ABGLT - 20 anos contribuindo para um Brasil sem discriminação e com liberdade de orientações sexuais e identidades de gênero.

Toni Reis
Secretário de Educação da ABGLT - mandato 2013-2016
Presidente da ABGLT - mandatos 1995-1998 e 2006-2012
Secretário Internacional de ABGLT - mandatos 1998-2003
Secretário Geral da ABGLT - mandato 2003-2006

Silas Malafaia Processa Toni Reis

Silas Malafaia Processa Toni Reis

Silas Malafaia processa Toni ReisApós afirmar em entrevistas que sente “repulsa” por expressões de amor gay e que ama os homossexuais como “ama os bandidos”, o controverso Pastor Silas Malafaia alega que sua reputação foi “imensamente ofendida” por Toni Reis, ex-presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABGLT) e atual Diretor Executivo do Grupo Dignidade.
ATENÇÃO: acompanhe a defesa de Toni Reis em nosso novo artigo sobre o caso.
Em “queixa-crime”, apresentada ao 16º Juizado Especial Criminal do Rio de Janeiro (que foi inicialmente negada), Malafaia considera-se vítima de difamação e injúria, exigindo que Toni e a ABGLT sejam condenados pela justiça por terem denunciado suas declarações como homofóbicas. O pastor recorre da decisão negativa da Justiça do Rio, sempre alegando que tem o direito de considerar homossexuais pecadores.

Entenda o caso: “Baixando o porrete”

Campanha de prevenção a DSTs
Uma das peças da 15ª Parada de São Paulo
A 15ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo aconteceu no dia 26 de junho de 2011. Como de costume, a Parada contou com uma campanha de prevenção a DSTs. Bem humorado, o slogan dizia: “Nem Santo te protege: use camisinha”. As peças publicitárias continham santos de devoção popular em poses sensuais. A Igreja Católica reagiu. Em artigo publicado dois dias depois, no jornal oficial da Arquidiocese de São Paulo, o Cardeal Odilo Scherer afirmou: “Ficamos entristecidos, quando vemos usados com deboche imagens de santos”, mas prosseguiu sua mensagem defendendo que a homossexualidade não é uma “opção” e alegando ser o celibato a melhor forma de evitar a contaminação pelo vírus da AIDS.
Em seu programa “Vitória em Cristo” (exibido pela TV aberta brasileira em 02/07/2011), o Pastor Silas Malafaia, não contente com a reação da Igreja Católica, foi mais longe e incitou:
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“Os caras na Parada Gay ridicularizaram símbolos da Igreja Católica e ninguém fala nada. É pra Igreja Católica ‘entrar de pau’ em cima desses caras, sabe? ‘Baixar o porrete’ em cima pra esses caras aprender (sic). É uma vergonha.”
Esse trecho se tornou viral nas redes sociais à época, num contexto em que jovens eram agredidos com lâmpadas em plena Avenida Paulista. Muitos se revoltaram contra as declarações de Malafaia, mas tememos que alguns tenham se sentido encorajados, por suas palavras, a “baixar o porrete” em homossexuais, dado o contínuo recrudescimento da violência homofóbica nos últimos tempos (como mostram repetidamente os relatórios sobre homofobia no Brasil da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República).
A ABGLT, na pessoa de seu então presidente, Toni Reis, sentiu-se impelida a reagir a tais declarações, e oficiou a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (Ofício PR 236/2011). O ofício questionava que a TV Aberta, uma concessão estatal, fosse utilizada para disseminar agressões contra as manifestações de homossexuais, repetia as declarações de Malafaia e exigia providências.

O Ministério Público Federal (MPF) contra Malafaia

Como resposta, em fevereiro de 2012, o MPF instaurou o Inquérito Civil nº 1.34.001.006152/2011-33, exigindo que uma retratação formal das declarações do pastor fosse veiculada pela TV Bandeirantes. Em maio do mesmo ano, o juiz federal da 24ª Vara Cível de São Paulo, Victorio Giuzio Neto, declarou extinta a ação movida pelo MPF. O Procurador Regional dos Direitos do Cidadão, Jefferson Aparecido Dias, recorreu da decisão de Primeira Instância e o processo foi remetido ao gabinete da Desembargadora Cecilia Marcondes, onde aguarda julgamento.
Em sua sustentação, o Procurador afirmou que:
[As manifestações do réu Silas Lima Malafaia] tem claro conteúdo homofóbico, por incitar a violência em relação a homossexuais, desrespeitando seus direitos fundamentais baseados na dignidade da pessoa humana. Ainda que haja a liberdade de culto e a liberdade de expressão, também previstas na Constituição Federal, a manifestação do pensamento não pode ser utilizada como justificativa para ofensa de direitos fundamentais alheios.
Essa é a opinião do Ministério Público Federal, com a qual concordamos. Não foi a primeira e, infelizmente, tememos que pode não ter sido a última vez que Silas Malafaia se manifesta contra homossexuais de maneira ofensiva. Ele se esconde atrás de um suposto direito de liberdade de crença, mas se esquece que seus direitos terminam quando começam os de outros.

A “Queixa-Crime”: Malafaia ofendido por ativistas gays

Malafaia, em um de seus cultos transmitidos pela TV.
Malafaia, em um de seus cultos transmitidos pela TV.
Descontente com a repercussão de suas declarações, acuado pela Justiça Federal, Malafaia decidiu processar a ABGLT e seu ex-presidente, Toni Reis, por difamação e injúria. Seu advogado alega que supostas ofensas do movimento LGBT ganharam “dimensão em razão do uso da rede mundial de computadores”. O advogado prossegue:
Em atitude que só se pode lamentar, os grupos e movimentos associados à proteção dos direitos e interesses de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais, vem realizando sólida e orientada campanha contra o ofendido [Silas Malafaia] que, injustificada e imotivadamente, é colocado na posição de adversário.
A petição inicial foi indeferida pelo Ministério Público e pelo Juiz, Arthur Narciso de Oliveira Neto, que consideraram a queixa-crime incompleta. Malafaia apelou da decisão e a justiça notificou Toni Reis, como ex-presidente da ABGLT, para que apresente resposta.
Ao ser intimado pelo Ministério Público Federal, Malafaia viu seu poderio ameaçado. Agora, procura se esconder atrás do manto da liberdade de religião, alegando que suas declarações não são homofóbicas nem violentas, mas mera manifestação de suas crenças. Toni vê como desesperada a atitude do pastor e confia na justiça brasileira.
A notificação judicial foi entregue na sede do Grupo Dignidade na última sexta-feira, 26 de julho de 2013, e pretendemos utilizar o prazo de dez dias para preparar a defesa. É importante salientar que, ao contrário do que alega Malafaia, o Movimento LGBT não teme o debate. Responderemos ao pastor de forma ordeira e pacífica, como sempre o fizemos.
Família de Toni Reis na Parada da Diversidade em São Paulo
Família de Toni Reis na Parada da Diversidade em São Paulo
Ativista pelos direitos humanos com reconhecimento internacional, Toni Reis não se surpreende com a postura do pastor. Infelizmente, o Brasil vem assistindo a intensificação da intolerância contra minorias por parte do fundamentalismo evangélico, propagado por pastores como Silas Malafaia e Marco Feliciano. Eles parecem não desejar outra coisa além de poder, um poder que se manifesta pela imposição de suas crenças contra os direitos constitucionais de minorias. Nossa luta continuará, nos tribunais, meios de comunicação e redes sociais, e a diversidade triunfará sobre o ódio. Nossas famílias – novas e orgulhosas famílias – continuarão indo às ruas de todo o Brasil celebrando a diferença e o amor que aceita sem discriminar.
O Grupo Dignidade, solidário a pessoa de seu Diretor Executivo, e zeloso pela defesa dos direitos humanos no Brasil, acompanhará de perto o desenrolar desse caso. Nos siga nas redes sociais para se manter informado sobre todos os desdobramentos.
Para maiores esclarecimentos sobre o caso, seguem documentos relacionados:

Íntegra da “Queixa-Crime” de Malafaia:



Íntegra do Ofício da ABGLT que originou a queixa de Malafaia:



Íntegra da Ação Proposta pelo Ministério Público contra Malafaia:



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Vida pública e política-Toni Reis



Vida pública e política


Toni Reis
Secretário de Educação Ass. Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

PUBLICADO EM 06/10/13 – 03h00
Qual a sua avaliação sobre a quantidade de casamentos?
Estou surpreso com o grande número de pessoas que estão procurando legalizar suas situações.
Alguma cidade te surpreendeu?
Fiquei feliz com Curitiba, mas achei poucos os casamentos em Porto Alegre, tendo em vista que é a capital onde os direitos LGBT estão mais avançados.
Acredita que o preconceito ainda atrapalha?
O preconceito e o medo da exposição ainda são um empecilho para as pessoas procurarem seus direitos, mas isso vem mudando. Em 1993, havia 7% de apoio à união estável e, hoje, 52% apoiam o casamento homoafetivo. A sociedade está mais respeitosa e acredito que, com o tempo, os casamentos vão aumentar gradativamente e passar a ser algo cotidiano.

Toni diz que Lula entendia melhor e debatia de forma mais afinada a questão LGBT

Movimento gay prefere Lula a Dilma
por Mariana Haubert, Congresso em Foco
06/01/2012
Para líderes de grupos LGBT, presidenta cedeu a pressões de religiosos e ainda não abriu diálogo com representantes dos homossexuais

Para Toni Reis, Lula entendia melhor as reivindicações do movimento LGBT. Foto: Brizza Cavalcante/Ag. Câmara
A presidenta Dilma Rousseff passou de ano “raspando” em sua estréia no cargo mais importante do país, na avaliação da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis). Apesar de ter prometido em sua campanha eleitoral que lutaria para garantir o respeito aos direitos humanos, inclusive os dos homossexuais, Dilma não conseguiu avançar em seu primeiro ano, segundo lideranças do movimento. Para eles, a presidenta cedeu a pressões de setores religiosos e não se abriu para as reivindicações da comunidade. Uma postura bem diferente da adotada pelo ex-presidente Lula, mais aberto ao diálogo e receptivo aos pedidos dos homossexuais, observam representantes de entidades ligadas à causa.
No último ano do governo Lula, o Ministério da Fazenda, através de uma portaria, estendeu o direito de declaração conjunta para casais homossexuais, inclusive para fins de Imposto de Renda. O ex-presidente ainda atendeu a uma reivindicação do movimento ao instituir 17 de maio como o Dia Nacional de Combate à Homofobia. Foi durante seu último mandato também que se viabilizou a 1ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT, realizada em junho de 2008, que contou com a presença do ex-presidente durante o evento de abertura.
“Bullying homofóbico”
Na contramão do ex-presidente, Dilma começou o mandato desagradando ao movimento LGBT. Em maio, seu quinto mês de governo, a presidenta suspendeu a produção e distribuição de materiais para o projeto Escola sem Homofobia, que previa a entrega de kits com cartilhas e vídeos para combater o bullying homofóbico em escolas da rede pública. “A homofobia é um problema grave nas escolas e algo precisa ser feito. Lamentamos o fato, porque foram oito meses de discussão sobre o projeto”, explica Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABLGT).
Ele atribui o recuo da presidenta às pressões feitas pela bancada evangélica da Câmara. Na época, o grupo composto por 74 parlamentares ameaçou obstruir a pauta do Congresso, além de votar a favor da convocação do então ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, para prestar esclarecimentos sobre sua evolução patrimonial, motivo que o levou a ser demitido da pasta. “É uma bancada muito expressiva. Tenho medo de que ela [Dilma Rousseff] fique refém deles. Isso só prejudicaria a elaboração e a execução de políticas públicas importantes”, afirma Toni Reis. O ativista atribui nota 7,5 ao primeiro ano de Dilma Rousseff. “Ela passou, mas passou raspando”, considera.
Vaias a Dilma
A suspensão do kit gerou uma onda de vaias e protestos contra a presidenta durante as principais paradas gays do país. Em São Paulo, cidade que sedia o maior evento desse tipo no mundo, ativistas da causa e simpatizantes vaiavam a presidenta a cada vez que seu nome era citado pelos organizadores.
Em dezembro do ano passado, durante a abertura da 2ª Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT, realizada em Brasília, militantes novamente vaiaram a presidenta, que foi representada pelos ministros Gilberto Carvalho (Secretaria da Presidência da República), Maria do Rosário (Secretaria de Direitos Humanos) e Luiza Bairros (Igualdade Racial). Os participantes entoavam o grito “Dilma, que papelão, não se governa com religião” e, em diversos momentos, chamavam pelo nome do ex-presidente Lula.
Para a pesquisadora do Observatório de Sexualidade e Política – ABIA, Jandira Queiroz, a posição do governo não é explícita, mas é perceptível. “Para o governo é: vamos tentando negociar o mínimo, dizendo que é muito”. Ela acredita que muito do que foi feito para avançar nessa causa veio de decisões do Judiciário, independentemente do Legislativo e do Executivo.
Para Toni Reis, o ex-presidente Lula foi um bom entendedor da causa LGBT. “Lula foi um grande presidente para nós. O diálogo dele com os movimentos sociais era mais tranquilo. Ele nos entendia muito bem e nos recebia para que pudéssemos apresentar nossas propostas. Já no caso da presidenta Dilma, nós já pedimos diversas audiências com ela, mas ainda não fomos recebidos. Inclusive, ela não recebeu o conselho e não participou da conferência”, conta Toni.
Engrossando a voz
Apesar do atual distanciamento com a Presidência, o presidente da ABLGT acredita que as portas com o Planalto não estão completamente fechadas. O problema, aponta ele, é que o diálogo não evolui. “Nós encaminhamos projetos, mas eles não vão adiante. Neste ano, vamos engrossar a nossa voz com ela, que infelizmente não está a contento”.
Para Toni, a diferença de relações advém das experiências de cada um. “Dilma não veio de um movimento social como Lula veio. Ela é uma pessoa política, mas não tem esse traquejo para lidar com os movimentos sociais”, observa. Ele também acredita que a pressão da bancada evangélica foi fundamental para impedir que a presidenta apoiasse outras pautas defendidas pelo movimento
Jandira, porém, tem visão menos positiva em relação a Lula. Para ela, assim como Dilma, o governo do ex-presidente também deixou a desejar nas políticas públicas voltadas para os direitos LGBT. “A presidenta Dilma [Rousseff] está dando continuidade ao projeto do governo anterior, uma política iniciada nos idos de 2001, que significa dar ‘doce na boca’ dos movimentos sociais para que não reclamem. Além do mais, o governo federal tem assumido posturas claramente cristãs, claramente influenciadas pelas bancadas cristãs no Congresso, e isso inclui tanto católicos quanto neopentecostais”, avalia.
PL da Homofobia
Tema polêmico, a discussão em torno do projeto que criminaliza a prática da homofobia ainda não saiu do papel. Apresentado em 2006, o projeto tramita na Comissão de Direitos Humanos do Senado, e estava previsto para ser votado na Comissão de Direitos Humanos do Senado no final do ano passado. Mas, devido à falta de acordo entre os senadores, a relatora do projeto, Marta Suplicy (PT-SP), pediu o reexame da matéria e adiou, assim, a votação. Ela admitiu que o pedido foi uma forma de evitar a rejeição da proposta pelos colegas e tentar outro acordo.
“Estava empatada [a votação], portanto, poderia ser aprovado ou não. Achei que por segurança deveria pedir reexame”, disse na época. O PLC 122 ainda não tem data definida para ser votado, mas a relatora deverá reapresentá-lo na volta dos trabalhos legislativos.
Toni Reis prevê uma “batalha muito difícil” para a aprovação da Lei da Homofobia, mas espera que a sociedade se mobilize para apoiar o projeto. “Os fundamentalistas estão muito bem organizados. É uma bancada fechada que luta contra os direitos humanos de nossa comunidade LGBT. Mas tenho esperança de que dará tudo certo”, disse. Ele acredita que a presidenta sancionará sem vetos a lei caso o texto seja aprovado pelo Congresso. “Ela não será contrária a essa matéria, até porque vários ministros têm se posicionado favoravelmente. E aí, sim, ela ganhará mais pontos conosco”, afirma.
Para Jandira, a possibilidade de aprovação do projeto é pequena. “O texto apresentado é fruto de negociações da senadora Marta Suplicy, nossa aliada, com representantes da bancada evangélica, cujo maior interesse é garantir que os direitos LGBT não sejam reconhecidos jamais, ou seja, é óbvio que o texto não contempla os desejos do movimento LGBT, e ainda acaba contemplando os desejos dos homofóbicos de plantão”, considera.
Fonte: http://mariafro.com/2012/01/06/ate-tu-toni-reis-movimento-gay-prefere-lula-a-dilma

Entrevista a Zé Dirceu – Toni Reis: “Falta coragem a nossos aliados. Eles têm medo de perder votos”

Entrevista a Zé Dirceu – Toni Reis: “Falta coragem a nossos aliados. Eles têm medo de perder votos”

Umas das principais referências do Brasil na luta pelos direitos dos homossexuais, Toni Reis diz que os partidos precisam ter mais coragem para assumir essa bandeira. “Temos muitos aliados que estão no armário. Não que sejam homossexuais. São heterossexuais, mas têm medo de perder votos”, diz o ativista em conversa com este blog.
Reis passou seis anos na presidência da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) – cargo que deixou no início deste ano – e é diretor do Instituto Brasileiro de Diversidade Sexual (IBDSEX) e do Grupo Dignidade. Ele diz que a comunidade gay conquistou direitos recentemente, via Judiciário, mas falta uma ação mais incisiva dos partidos políticos – e, acentua, também do Executivo.
Para Toni Reis, existe hoje uma ameaça real e significativa à conquista dos direitos das minorias: o fundamentalismo religioso. “E o poder que essas pessoas estão tendo, inclusive elegendo representantes nas Câmaras, nas Assembleias e no próprio Congresso Nacional.”
Reis também alerta que é preciso aprovar o mais rapidamente possível o projeto que criminaliza a homofobia no país. Acompanhe a entrevista:
[ Zé Dirceu ] Como podemos classificar o Brasil em relação aos direitos homossexuais? Comparado com outros países, como o Brasil está?
[ Toni Reis ] O Brasil evoluiu bastante na questão do Judiciário, nós temos alguns direitos através do Supremo Tribunal Federal. A decisão sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade [da união homoafetiva] foi unânime, e isso para a gente foi fundamental. Hoje já temos cinco Estados que já tem o casamento, mas através da Justiça.
No Legislativo, estamos no atraso. Temos lá um problema sério do fundamentalismo. Tem um setor muito organizado. Embora tenhamos aliados, tem muita gente em cima do muro. Estamos bastante atrasados em relação a Uruguai – apenas para citar os vizinhos –, Argentina, Bolívia, Equador, Venezuela, México e Cuba. Argentina está ganhando de dez a zero.
Com relação à Europa, estamos perdendo feio para Portugal, para Espanha, vamos perder também para a França. Tudo isso no Legislativo.
No Executivo, tivemos um grande avanço na época do governo Lula. Nós tivemos a primeira Conferência Nacional dos Direitos Humanos, que foi um grande avanço, com a presença de oito ministros, do presidente Lula, mesmo com todo um setor fundamentalista pressionando que ele não fosse.
Mas agora, no Executivo, tivemos um retrocesso, principalmente com o pronunciamento da presidenta Dilma Rousseff por causa do material que feito com mais de 500 técnicos, mestres, doutores, o material da Escola Sem Homofobia [o kit acabou sendo vetado]. Por pressão de um setor, foi suspenso. Nós estamos dialogando para superar esse impasse e mostrar que não é propaganda de opções sexuais. O que nós queremos é cidadania, direitos humanos, não queremos privilégio nenhum. Queremos ser tratados como qualquer cidadão, naturalmente.
Então, em resumo, não somos nenhum país da África onde há pena de morte para homossexuais – hoje temos sete países no mundo assim e 75 países que criminalizam a homossexualidade –, mas estamos longe… Se fosse dar uma nota para o nosso país, seria nota seis.
Mas podemos recuperar e creio que a nossa mobilização tem conseguido isso. Através das nossas paradas, temos 200 paradas em todo o Brasil. A ABGLT está com 284 organizações em todos os Estados e nas maiores cidades. Eu creio que a gente tem que forçar um pouco e trabalhar para diminuir essa questão do fundamentalismo religioso.
[ Zé Dirceu ] Como é nas empresas, nas universidades hoje? Avançou?
[ Toni Reis ] Temos 30 universidades, das federais, com grupos de estudos, publicações, estudiosos. Nas empresas, uma pesquisa do Departamento Nacional de DST/Aids mostra que 51% de nossa comunidade já foi discriminada. Dentro da educação, é um problema sério: 40% dos meninos não gostariam de estudar com gays ou lésbicas.
Para nós, de todas as áreas, a educação é a fundamental. E a questão é do respeito à diversidade. Todos precisam ser respeitados. Não precisa aceitar, não precisar pegar a bandeirinha do arco-íris e ir à Parada Gay. Mas respeitar os nossos direitos é o que queremos.
[ Zé Dirceu ] Por que a Assembleia da França – e de outros países anteriormente – conseguem aprovar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e o Brasil continua parado? É mais por causa da reação fundamentalista ou também falta de coragem?
[ Toni Reis ] Falta coragem de nossos aliados. Temos muitos aliados que estão no armário. Não que sejam homossexuais. São heterossexuais, mas têm medo de perder votos.
No caso da Espanha, da Argentina e do Uruguai, os partidos foram fundamentais. Os partidos têm que levantar a bandeira e ter coragem de defender os direitos humanos. Os direitos humanos são para todos, independentemente da orientação sexual, da cor, da religião…
O posicionamento do [François] Hollande [presidente da França] foi fundamental, ele foi lá e bancou. Precisamos de um posicionamento partidário. Nós, do movimento, estamos fazendo nosso papel, mas quem toma a decisão no Legislativo são os partidos. Precisamos que assumam essa bandeira do princípio da igualdade.
[ Zé Dirceu ] Nesse sentido, como você avalia a postura do PT?
[ Toni Reis ] O PT, historicamente, sempre nos defendeu. Tivemos duas ou três exceções que parlamentares que se posicionaram contra, mas que foram chamados ao conselho de ética, inclusive dois saíram do partido…
O partido tem resolução desde sua fundação, tem documentos, tem um posicionamento muito claro. Embora, em dados momentos, tenha se assustado com esse fundamentalismo. Nós precisamos de uma postura mais crítica e incisiva. Precisamos enfrentar e dizer “queremos a laicidade do Estado”.
Respeitamos evangélicos, católicos, ateus, judeus, mas precisamos de uma ação mais incisiva do PT e por parte dos partidos de esquerda e de outros, porque nossa comunidade vai desde a extrema esquerda até a direita.
O PT tem uma história de apoio [à comunidade gay] e inclusive sofre por isso. Nas eleições passadas, setores conservadores e fundamentalistas atacaram candidaturas do PT.
[ Zé Dirceu ] Qual a importância de políticas públicas no combate ao preconceito e na conquista de direitos?
[ Toni Reis ] É fundamental. O Estado existe para as pessoas que mais precisam. Para a gente ter a igualdade de direitos e oportunidades. Isso é fundamental em todos os ministérios da área social.
[ Zé Dirceu ] Há um projeto tramitando no Congresso que admite a cura da homossexualidade. Acredita que haja chance de aprovação?
[ Toni Reis ] Infelizmente deve passar nas comissões, mas deve ser derrubado em plenário. Isso é um acinte. Isso foi derrubado em 1990 pela organização Mundial de Saúde. A Associação de Psiquiatria derrubou em 1973. A homossexualidade não é uma doença. Isso [projeto] está ferindo a autonomia dos conselhos de psicologia, é muito grave. É uma perda de tempo, é uma besteira muito grande.
[ Zé Dirceu ] Na última campanha municipal, houve exploração da homossexualidade (usando o termo “kit gay”, por exemplo). Qual o impacto disso sobre o eleitor, sobre o cidadão?
[ Toni Reis ] O material Escola Sem Homofobia – tivemos uma grande pesquisa em 11 capitais, tivemos seminários em todas as regiões, mais de 500 pessoas participaram – é muito bem feito, em nenhum momento havia apologia à homossexualidade. Eu acho que [o uso eleitoral] foi um desserviço à cidadania. Prova disso foi em São Paulo, onde o [prefeito Fernando] Haddad foi atacado.
Inclusive eles [adversários de Haddad] tinham copiado parte do material, que era muito bem feito. Material do próprio José Serra [durante seu governo em São Paulo]. E a gente sempre viu o José Serra, como ministro da Saúde, positivamente. Ele falou uma frase que na época me marcou muito: “As religiões devem cuidar da alma e eu, como ministro, devo cuidar do corpo”. E depois ele não praticou o que falou. Então, isso para a gente foi bastante triste.
Mas a população reprovou isso na cidade de São Paulo. Mas em algumas capitais e em algumas cidades, pegou esse discurso conservador, que é muito raso.
[ Zé Dirceu ] E nas escolas, o que pode e tem sido feito no combate à discriminação?
[ Toni Reis ] Eu acho que a resposta é a educação, para a questão do machismo, do racismo, de todas as formas de discriminação. Tem que aprender a respeitar o outro, seja qual for a especificidade. Tem que aprender a conviver harmonicamente e sem discriminação.
É por isso que a gente vai atuar nas conferências de educação, tanto municipais, estaduais e federal. Queremos que tenha mais estudo sobre isso, não levando a apologia à homossexualidade, porque não precisa de apologia. Queremos apologia à cidadania, ao respeito, à convivência harmônica. E a escola é fundamental nesse sentido.
[ Zé Dirceu ] Que tipo de papel cumprem hoje as ONGs que defendem os direitos humanos de gays, lésbicas e travestis?
[ Toni Reis ] Primeiro, o denunciar toda e qualquer forma de discriminação. Nesse sentido, o governo Lula e agora a Dilma têm feito sempre. Hoje nós temos dados reais. Tirou do armário o preconceito e a discriminação, através do Disk 100, por exemplo. Hoje temos um diagnóstico da discriminação.
Segundo, da conscientização dessa comunidade. E terceiro, fazer o que chamamos de advocacy, que é o antigo lutar. Fazer o advocacy junto às autoridades competentes para que haja políticas públicas.
[ Zé Dirceu ] Embora não seja possível fazer uma escala de preconceitos, há um perverso, até mesmo entre os gays: contra travestis e transexuais. Há esperança de mudança em curto prazo?
[ Toni Reis ] Nós somos frutos do preconceito. Temos mulheres machistas, negros que são racistas e gays que são homofóbicos – inclusive no mundo político. Há muitas pessoas que não aceitam sua sexualidade e acabam tendo uma certa aversão, prejudicando nossos direitos.
[ Zé Dirceu ] Casos de violência contra homossexuais e travestis são um problema de polícia ou também de política?
[ Toni Reis ] Acho que os dois. Temos um levantamento que mostra cerca de 3,8 mil casos de assassinatos [de homossexuais] no Brasil, é muita gente. São assassinatos gravíssimos, com requintes de crueldade. Muitas vezes, apenas 2% desses casos são resolvidos. Tem que haver investigação, a impunidade é muito grande.
Tivemos recentemente em Valparaíso (GO) um caso em que a própria polícia decepou os dedos de uma menina lésbica [a denúncia está sendo investigada]. Isso choca. Na UnB, uma lésbica foi espancada dentro da universidade. Precisamos de política para as pessoas respeitarem.
[ Zé Dirceu ] Como você vê hoje a representação de gays e lésbicas na TV brasileira?
[ Toni Reis ] Melhorou. Mas ainda temos três problemas: nos programas policiais; nos religiosos, nos quais alguns pastores se utilizam de uma concessão pública de forma sorrateira para incutir no pai, na mãe e nos familiares o preconceito; e nos programas humorísticos.
Mas a gente tem percebido que as telenovelas e os telejornais realmente têm melhorado. Foi a primeira profissão no Brasil – os jornalistas – em que aprovamos, em 1987, o respeito pela orientação sexual. A cobertura dos jornais impressos melhorou.
Claro que existem alguns setores, alguns articulistas bastante homofóbicos, mas em geral os meios de comunicação têm dado uma cobertura interessante à nossa situação.
[ Zé Dirceu ] Qual o principal problema enfrentado hoje?
[ Toni Reis ] É o avanço do fundamentalismo religioso. A intolerância religiosa à questão dos direitos das mulheres, das minorias, é um problema sério. Hoje a bola da vez são os homossexuais. Mas há a questão das mulheres, dos negros, dos ateus, dos espíritas. Nós estamos resistindo de todas as formas.
Então o grande problema hoje é o fundamentalismo religioso. E o poder que essas pessoas estão tendo, inclusive elegendo representantes nas Câmaras, nas Assembleias e no próprio Congresso Nacional.
[ Zé Dirceu ] Esse fundamentalismo está refletindo no dia a dia? Não é uma contradição com os avanços dos últimos anos?
[ Toni Reis ] É porque os fundamentalistas também saíram do armário. Eles falam abertamente, estão aí os projetos de lei. Se você pegar, por exemplo, o João Campos (PSDB-GO), ele tem seis, oito projetos contra a nossa cidadania. Ele quer derrubar a decisão do Supremo [a favor da união homoafetiva], quer derrubar todas as políticas da área da Saúde para travestis e homossexuais. E eles vêm com argumento bíblico, dogmático, fundamentalista.
Por isso, buscamos nos aliar com religiosos que são abertos a essa discussão, com ateus e com as pessoas que querem um estado laico.
Os fundamentalistas não podem incentivar o preconceito, a discriminação e a violência. E é isso que eles estão fazendo, com o manto da livre expressão. Temos que defender a livre expressão, mas não que incentive a discriminação.
[ Zé Dirceu ] E qual a prioridade neste momento?
[ Toni Reis ] É preciso criminalizar os crimes de ódio. Tivemos uma reunião com o senador Paulo Paim (PT-RS) [relator do projeto que criminaliza a homofobia] para discutir o assunto. Não queremos prender nenhum padre, nenhum pastor por questões filosóficas, a não ser que as pessoas incentivem a violência e a discriminação. Essa é a prioridade nossa no momento.
FONTE: http://www.zedirceu.com.br/toni-reis-falta-coragem-a-nossos-aliados-eles-tem-medo-de-perder-votos/

Entrevista de Toni a Gralha – “Quem tem que sair do armário é a felicidade”

Entrevista de Toni a Gralha – “Quem tem que sair do armário é a felicidade”

Antônio Luiz Martins dos Reis é um homem determinado. Nascido há 49 anos (completa 50 em 20 de junho do ano que vem) na machista Coronel Vivida, veio com 20 para Curitiba, onde cursou letras e iniciou seu treinamento como militante em tempo integral. Foi morar na Europa e, em Londres, conheceu David Harrad, que trouxe para Curitiba em 1990 e com quem vive até hoje. Os dois se completaram ao adotar o garoto Alison em 2002. São uma família feliz, enfim.
Toni Reis é um pioneiro na defesa dos direitos das minorias. Criou o Grupo Dignidade, em 1992, quando a provinciana Curitiba só via ser desfraldada a bandeira do travesti Gilda. Toni é uma figura pública que orgulha não só a comunidade LGBT, mas a cidadania. Os partidos sempre lhe mandaram olhares sedutores, e agora, pelo jeito, ele decidiu partir pra pesada: filiou-se ao PCdoB, o histórico Partido Comunista do Brasil, uma agremiação bastante democrática, acredita o futuro candidato.
A história de vida de Toni, evidentemente, dá um livro (eis um desafio para os escritores cá da terrinha). Filho de Miguelino Martins dos Reis e de Maria Consceição Muller dos Reis, tem vivos apenas dois de seis irmãos. Viadinho da escola, no interior, construiu seu caminho com determinação. Formou-se e doutorou-se, viveu no exterior, derrubou barreiras em nome da união civil homoafetiva e da adoção por casais de mesmo gênero, peitou Felicianos e Bolsonaros. Pintou e bordou, como se dizia antanho.
Sigam os melhores trechos da conversa de Toni Reis com o editor Leandro Taques*, também autor das fotos.
A Gralha – Quem é o cidadão Toni Reis?
Toni Reis – Eu nasci em Coronel Vivida, fui criado em Pato Branco e Quedas do Iguaçu e vim para Curitiba em 1984. Estudei letras na Federal, militei no movimento estudantil e no movimento partidário. Depois tive a possibilidade de morar quatro anos na Europa, voltei pra cá e formamos o Grupo Dignidade de Direitos Humanos LGBT. Eu sou uma pessoa idealista, mas muito concreta. Gosto de realizar todos os meus sonhos. Um idealista concreto, pragmático, que, no entanto, persegue e gosta de realizar suas utopias.
A Gralha – A partir de que momento você se reconheceu como homossexual?
Toni Reis – Ui!!! A prática, desde que eu me conheço por gente. Cinco anos, três anos, eu sempre percebi que tinha desejo pelo mesmo sexo. O meu pescoço torcia pelo sexo masculino. Mas isso no interior é muito comum, troca-troca, direitinho… Vocês querem que eu responda longamente??? A prática minha começou desde a tenra idade, cinco anos de idade, foi muito precoce. Com os primos e os amiguinhos era troca-troca direto. Mas eu me percebi gay, a identidade gay, aos 14 anos, e eu me lembro, como se fosse hoje, o dia que eu cheguei e falei pra minha mãe. Comecei a sofrer discriminação e foi aí que eu percebi. Porque até então todo mundo fazia e ninguém falava esse nome, que era viado. Naquele tempo, e ainda agora, quando você queria agredir alguém, chamava de viado, de bicha. Mas foi quando eu comecei a ser rejeitado no jogo de futebol. Cheguei e falei para mãe: “Eu quero contar uma coisa para a senhora. Eu sou gay, pecador, doente e sem-vergonha e eu não quero isso pra mim, eu quero me libertar disso, eu quero me curar, não quero mais ser isso e quero sua ajuda.” Minha mãe estava fazendo almoço, cortando cebola e começou a chorar. Não sei se ela chorou por causa da minha homossexualidade ou por causa da cebola. Mas ela confirmou que eu era pecador, doente. Que precisava procurar uma professora e procurar saber o que é isso. A professora me disse que era um problema, que eu precisava procurar um médico, um psicólogo. Então minha mãe me levou para Pato Branco, me levou ao médico. Eu tinha 14 anos.
Aí começou um período da minha vida que eu chamo de “a busca da cura”. O médico urologista, Dr. Peixoto, de Pato Branco, me examinou e disse que eu estava bem de saúde, que poderia ser uma variante de sexualidade. Sugeriu que eu fosse para uma capital, que eu estudasse, fosse alguém na vida, me desenvolvesse. Ao voltar pra casa, por ser muito ligado à Igreja, coisa que ainda hoje eu sou. Sou um cristão nietzscheniano. E aí eu falei com o padre da Paróquia, o padre Sigismundo, e ele me disse: “Iiiiii, meu filho, isso é pecado, se afaste dos sacramentos, não comungue, saia da liderança da juventude porque você é um mau exemplo. Mas faça uma novena para Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, pra se curar, pois ela é a santa dos enfermos. Faça a novena. Se a novena não funcionar e você tiver recaída, você volta pro primeiro dia da novena. Eu tive muitas recaídas. Na época passava uma novela, Pai Herói, e o Toni Ramos, naquele tempo, ele era bonitinho (hoje ele está meio caído). Eu tinha recaída e aquela novena virou quarentena e não me curei.
Deixei a Igreja Católica, me mandaram para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus, onde busquei a cura e não deu certo, depois fui no pai de santo e ele me disse que eu tinha a pomba gira com duas cabeças desgovernadas… Tomei xaropada, tomei leite de égua, xaropada de amendoim… Toda a minha família tentou me “ajudar” a sair disso, mas não saí, aí vim para a capital, estudei, tive a oportunidade de viver na Europa, casei, e foi aí que me identifiquei. E hoje, se tiver cura, não quero me curar, estou muito feliz assim.
A Gralha – Desmentindo cada vez mais o Marco Feliciano, dizendo que não há a cura gay?
Toni Reis - Com certeza, essa questão do Feliciano é um engodo. A pessoa pode ou não assumir, há pessoas que não assumem na sociedade. Conhecemos pessoas no meio político ou profissional que são homossexuais que acabam não se assumindo para elas mesmas. Isso pode acontecer. A pessoa sublimar seus desejos. Eu quero viver intensamente.
Gralha – É nesse momento que você se torna essa liderança?
Toni Reis – Eu sempre fui liderança. Eu lembro que com 12 anos fui coordenador de classe, fui do grêmio estudantil Olavo Bilac, fazia o jornalzinho da escola. Eu sempre tive essa liderança e mesmo – até uma questão psicológica – para superar o preconceito e discriminação, eu usava isso. Se eu não era convidado para jogar bola, eu comprava a bola para ser o primeiro a ser chamado. Eu sempre me utilizei da liderança. Por todo esse sofrimento eu falo isso muito abertamente, de forma muito tranquila. Depois que vim para Curitiba, que comecei a fazer a discussão de gênero na Universidade Federal, fui presidente da Casa do Estudante Universitário. Eu sempre gostei muito de política. Os meus apoiadores sempre me diziam: “Toni, não precisa falar que você é gay. Vamos tentar falar que você não é. “ Mas sempre achei que precisava falar.
E foi na Europa que eu entendi. Chegando a Madrid, participei de grupos LGBT; no Partido Comunista em Milão. na Itália; depois na França, na Inglaterra, fiz parte de várias organizações LGBT. Foi lá que percebi que a questão da homofobia e do preconceito é cultural e se a gente aprende a ser homofóbico, ter a homofobia internalizada, se é cultura isso a gente pode mudar. Quando voltei pra Curitiba, fiquei três meses, cheguei em janeiro de 1992 e em março nós criamos o Grupo Dignidade. E foi muito difícil. A gente fez divulgação e não aparecia ninguém, só eu e meu companheiro que fazia reunião lá em casa. Com pauta, ata e ficávamos discutindo. Ai apareceu uma pessoa e ficamos muito felizes. Em junho, apareceram umas dez pessoas. Mas ninguém queria colocar o nome. Tivemos que emprestar RG e CPF para formar o Grupo Dignidade. Ninguém queria aparecer. Aí coloquei a cara para bater. E começamos.. No nosso estatuto tinha a questão de formarmos uma associação brasileira que formamos em 1995 e eu tinha, desde 1983, mantido correspondência com Luiz Mott, porque eu tinha muita curiosidade, queria saber, queria ler sobre o assunto. Eu li muito sobre o assunto: gay, lésbica…
Naquela época era homossexual, não se falava LGBT. Naquela época, em 1984, não se falava muito em homossexualismo. Foi aí que eu me tornei a liderança, a partir de formar um grupo, me envolver, trabalhar coletivamente. E aí essa liderança veio, se manifestou, nunca foi planejada e sim, consequência. Hoje eu falo e me sinto muito bem, encontro pessoas que me dizem: “Toni você me ajudou, quando eu li a sua entrevista na Veja em 1993; quando você foi no Serginho Groismann, em 1995.” Creio que a liderança, no campo LGBT, veio a partir da minha história de vida.
Gralha – Quais os maiores obstáculos/dificuldades para o debate LGBT no Brasil?
Toni Reis – Primeiro eu acho que conseguimos muito… de quem era pecador, doente e criminoso, a gente chegar no Supremo Tribunal Federal e unanimemente conseguir o casamento através da união estável no STF e depois a resolução do Conselho Nacional de Justiça. Já conquistamos muitas coisas, mas ainda temos muitos desafios. O primeiro é a aprovação da criminalização da homofobia. Isso é fundamental.
Todas a minorias têm uma lei. A Maria da Penha para as mulheres, a lei do racismo, tem a lei para pessoas deficientes, lei pro cigano, mas não tem nenhuma lei que criminalize a homofobia. Outro desafio é a gente superar esse preconceito que gera a discriminação e a violência. Em 1993 nós tínhamos somente 7% de apoio da população; hoje já são 52% de apoio da população. A sociedade mudou. E ainda temos um grande entrave que é o componente religioso, o fundamentalismo religioso, principalmente de certas religiões evangélicas fundamentalistas. Isso é um desafio para a gente.
Gralha – E a questão religiosa, como conciliar religião e LGBT?
Toni Reis – Eu lido muito bem com isso. Quando falo para um grupo heterogêneo, sempre começo falando do princípio da igualdade, tanto na declaração universal dos direitos humanos que diz que todas as pessoas têm igualdade de direitos e a Constituição Federal, que diz que todos somos iguais sem discriminação de qualquer natureza. Acho que a partir disso… esse é o princípio básico e que a gente precisa ser respeitado. Nunca pedi em algum curso ou palestra que as pessoas me aceitem, me abracem, me beijem, me levem pra casa para jantar, mas eu quero que me respeitem. Isso eu exijo. A aceitação é de coração, mas o respeito é obrigação de qualquer cidadão. É o outro, que pode fazer o que quiser da vida dele e eu não aceitar, mas o respeito é importante. E eu nunca tive problemas, eu dou cursos para profissionais de educação, profissionais de saúde e nunca tive um problema. A não ser uma vez em uma escola onde havia um pastor e ele queria discutir levíticos. Aí parei e falei: “O sr. quer discutir  a bíblia, tudo bem, eu também sou cristão. Eu vi que ali na esquina tem uma igreja e a gente pode ir para lá, depois do curso e discutimos.” Mas aí é um dogma e dogma é outra questão, que você não tem que ficar dizendo sim ou não, você respeita ou não. Eu nunca discuto a partir de um livro sagrado. Eu discuto a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal. Nunca tive problema.
Gralha – A religião também estabelece o padrão da heteronormatividade na nossa sociedade. A discussão LGBT tem o objetivo de superar esse padrão heteronormativo ou tem o objetivo de conviver harmoniosamente com esse padrão?
Toni Reis – Precisamos perceber que as pessoas vejam cada indivíduo com uma orientação sexual. Se temos dois milhões de pessoas em Curitiba, nove milhões no Paraná e 200 milhões no Brasil, nós temos 200 milhões de orientações sexuais diferentes. Cada um tem uma diferença. Não podemos ser binários. Eu seu hetero, hetero, hetero ou sou homo, homo, homo. Enfim, cada um tem a sua sexualidade e a gente precisa trabalhar isso. Precisamos questionar a heteronormatividade, mostrar que existem outros tipos além da heteronormatividade. Vejo que não podemos ser oito ou 80. Entre oito e 80 existem 72 possibilidades. Creio que a sexualidade é um oceano. Muitas pessoas fazem dela um aquário, outras um lago, outras uma cachoeira.
Existem pessoas que são restritas na sexualidade. Tenho amigos e amigas que são papai e mamãe, outros têm relações diferentes, abertas, fechadas. Tem pessoas que casam, são infelizes, mas, por uma questão de norma, continuam casados. Temos que respeitar. É o livre-arbítrio. Nesse sentido a heteronormatividade tem que ser questionada, mas precisa ser respeitada. Se a pessoa tem um padrão rígido, tem que respeitar, desde que me respeite… E a gente tem que pregar, não podemos querer destruir tudo e reconstruir uma nova concepção. E temos conseguido avançar, ter apoio de alguns setores da sociedade, inclusive setores mais conservadores.
Gralha – Qual sua opinião a respeito dos governos Gustavo Fruet, Beto Richa e Dilma Rousseff?
Toni Reis – Enquanto liderança LGBT, conversamos com os três. Cada um com a sua forma. Por exemplo, nós estivemos com o governo Dilma. Sabemos, é um governo de composição. Lá tem 60% de pessoas que são mais abertas, mas tem 40% que são muito conservadores. No governo Dilma, inclusive, tivemos retrocessos, se compararmos com o governo Lula. Que agora estamos recuperando, “inclusive” dialogando. As manifestações de junho foram bacanas. Nós fomos o segundo movimento a se recebido pela Dilma. Primeiro a Juventude, depois o LGBT. E questionamos a suspenção do material Escola Sem Homofobia, suspensão da campanha para a nossa comunidade a questão HIV/AIDS e a postura. Mas ainda temos um diálogo bastante tranquilo.
Com o Governo Beto Richa, nós nunca tivemos acesso a ele, nós temos alguns secretários mais abertos, a Secretaria de Justiça, a Secretaria de Educação, da Saúde, temos um diálogo bastante tranquilo. A gente precisa ter uma política de estado e não de governo. Estamos avançando no Paraná, num passo muito lento, mas estamos avançando.
Com o Gustavo Fruet, ele assinou compromisso, eu mesmo fiz campanha para ele no segundo turno, vejo que é uma pessoa extremamente aberta. Tivemos uma audiência com ele e estamos aguardando as definições. Eu espero que seja um governo avançado na nossa questão. Ele assinou e inclusive fez uma observação no termo de compromisso que está guardado no cofre da instituição que se ele não cumprir está documentado para cobrar dele. Ele disse: “Eu vou defender a Constituição, que diz que não deve haver discriminação de qualquer natureza.” Já tivemos essa sinalização.
Nós queremos ter aqui em Curitiba o tripé da cidadania, como no âmbito nacional, que é ter o Conselho Municipal LGBT, um Plano e uma Coordenadoria, da mesma forma no estado, queremos um Conselho, um Plano e uma Coordenadoria. Nacionalmente tivemos com o Lula e a Dilma continuou. Creio que na questão LGBT, com os três governos estamos avançando, claro que se compararmos os governos…. A Dilma superou o Lula em algumas questões sociais como a saúde, a educação. No Beto Richa, eu não vejo grandes avanços nas questões sociais e com o Gustavo creio que é cedo para fazermos alguma análise, mas eu gosto da forma do governo e dele em ser transparente. Abriu a caixa preta do orçamento, já senti muitas melhoras na questão da saúde, sou usuário, tenho a carteirinha do SUS e já mandei um elogio para o secretário da Saúde. Está melhorando.
Gralha – Quando você e David começaram a vida em comum em Curitiba, residiam na rua Cruz Machado, na boca do lixo, e eram vistos como alienígenas – mas compreendidos, ao que me consta. O que mudou de lá para cá, materialmente, na vida de vocês? Vocês são reconhecidos pelas pessoas como um casal?
Toni Reis – Continuo na Cruz Machado, na boca do lixo. Quando chegamos, pagamos 10 mil dólares no apartamento, e continuamos morando lá no mesmo apartamentinho e não saio de lá, vou morrer lá. Adoro o apartamentinho, nunca tive um problema e ali realmente os bares são boca-quente, começa 18 horas e termina… é 24 horas. Tem prostituição, drogas, música e nunca tive problemas. Fecho minha veneziana e durmo tranquilamente. Todos os comerciantes me conhecem, conhecem meu marido David, meu filho, conhecem meus dois cachorrinhos, o Victor Hugo e a Honey Panny, conversam com os cachorrinhos, dão comida pros cachorrinhos. É uma convivência, eu nunca fui discriminado na minha rua. Em Curitiba, em geral na rua, muito pelo contrário, eu já fui discriminado por ser do Coxa. “Ô viadão!!!” Por eu estar com a camisa do Coxa. Mas não por ser homossexual. Outro dia estava de bicicleta na ciclovia com o Alison (filho) e o David e alguém passou e gritou “Oi Toni.” E o outro ciclista, que vinha atrás, achou que eu tinha sido xingado e o cara já saiu em minha defesa: “Não ligue, tem gente que discrimina e tal.” Me defendendo. Então, muito pelo contrário, nunca teve problema e eu frequento todas as classes sociais, alta, média, baixa. Evangélicos e católicos me convidam para festas.
Creio que eu fui integrado à cultura curitibana de forma muito tranquila. Eu gosto de estar convivendo bem com todo mundo. Mas não deixo de questionar. Se alguém falar gay é feio, eu vou lá e questiono. Tenho um ofício padrão, já mando para o Ministério Público, já mando registrar o boletim de ocorrência. Fomos integrados, mas ainda existem questionamentos, não da minha pessoa, mas pessoas que são discriminados no trabalho, na escola, na igreja, em todos os lugares. Mas eu enquanto pessoa nunca tive problema ou sofri alguma violência. Existem algumas coisas nas redes sociais. Inventam perfis fake meu Facebook, tentam prejudicar minha imagem, mas eu sou tranquilo, eu relevo.
Gralha – Vocês adotaram um filho. Gostaria que nos contasse como foi esse processo e quais as dificuldades no Brasil para a adoção de crianças por casais compostos por pessoas do mesmo sexo.
Toni Reis – O David é inglês e eu sou indígena e alemão. E o meu lado alemão é muito certinho. Tudo que a gente faz é com muito planejamento. Em 1990, quando a gente casou, pensamos em adotar, mas aí pensamos, será que a criança não vai sofrer?  Pensamos, pensamos e em 2002 decidimos, vamos adotar uma criança. Aí entramos na Vara da Infância para adoção. Tivemos uma receptividade muito boa com o psicólogo do serviço social, aí fizemos todos os passos, fizemos os cursos, visitaram nossa casa, falaram com os padrinhos, as madrinhas, a família estendida… não tivemos problemas.
O juiz na primeira instância falou: pode adotar, mas só pode ser menina e maior de dez anos. Achamos a decisão discriminatória. Recorremos ao Tribunal de Justiça do Paraná e eles falaram, pode adotar de qualquer idade. Uma procuradora do Ministério Público questionou. Quis discutir o mérito. Aí fomos para o Superior Tribunal de Justiça. Também foi questionado pelo Ministério Público e aí fomos para o Supremo Tribunal Federal e, numa decisão monocrática, o ministro Marco Aurélio sentenciou: “Pode adotar.”
Quando você vai adotar, pode colocar as características. Nós não escolhemos nada, fomos conhecer o primeiro, o Alison, e no primeiro dia ele já nos conquistou. O Alison veio com um xaveco dizendo que queria ser médico, ensinou a gente como comer à mesa, como bom carioca conquistou a gente. Garoto inteligente, quer ser médico, bem educado… adotamos. Agora nem quer mais saber de ser médico, quer ser bombeiro, artista de rua. Foi um processo super legal, mas há dificuldade. Também achamos que na escola seria complicado, mas acompanhamos. Todo mês fazemos uma visita, às vezes semanalmente, porque o Alison é muito questionador, bagunceiro e precisamos ir lá, conversar com ele e tal.
Percebemos que toda criança é discriminada por algum motivo – por ser magra, por ser gorda, por ser baixinha, por ser negra ou branca demais, mas ele não tem sentido esse preconceito. Ele está se adaptando bem a Curitiba, já está falando leite quente, dor de dente, super integrado. As vezes ele fala: “Tenho dois pais. Eles são chatos, mas são legais.”
Gralha – Você sempre foi assediado por partidos para sair candidato a deputado, estadual ou federal. Parece que agora vai. Fala-se no PC do B. Por que o PC do B? Como se deu essa decisão?
Toni Reis – Eu sempre fui do campo popular democrático. Eu tive uma passagem pelo Partido dos Trabalhadores e aí, por uma questão boba, de uma postura que eu tive no Conselho Municipal de Saúde, me pegaram no pé porque eu fiz uma votação diferente do pessoa do sindicato e me questionaram e eu fui para o PSB. Depois saí e fiquei dez anos sem partido. Cansei, não quero mais saber de política partidária. Fui fazer minha especialização, meu mestrado e doutorado. Numa conversa que tivemos com o presidente Lula, ele me incentivou a ser candidato por essa forma legal de você defender a laicidade do estado, o povo LGBT, direitos humanos, educação. Aí me animei. Recebi convites de cinco partidos diferentes. Do próprio PT, do PSD, do PP, do PHS e do PC do B. Fomos conversando com as pessoas e partidos e a proposta do PC do B foi muito bacana.
Cumpri um certo papel no movimento social e agora me disponibilizei para a luta partidária. É no parlamento que vai ser a questão das leis e aceitei o PC do B e estamos muito bem. É o partido mais antigo do Brasil, é um partido que sofreu todos os preconceitos e eu até brinco quando me perguntam por que o PC do B. É o partido que mais sofre preconceito. Ou da direita ou da esquerda. A direita fala que come criancinha e a esquerda que fala que é muito adesista. Mas é um partido que esteve 65 anos na clandestinidade e sobreviveu.
Eles têm uma base teórica de princípios muito rígida e a democracia interna é muito bacana. Eu mesmo me surpreendi. Eu não achava que era assim. Tinha lá minhas dúvidas… Quando falavam de centralismo democrático. Quero ter liberdade de opinião. Lá tem liberdade de opinião, mas decidiu, é a decisão partidária. E tem os fóruns para se fazer esses questionamentos. E eu estou muito bem por lá. E estar discutindo essa possibilidade de uma candidatura é importante. O debate de todos os grupos sociais é bacana, importante.
Gralha – Quando você coloca essa possibilidade de pré-candidatura a deputado federal, qual seria seu espelho para atuação parlamentar? Seria o Jean Wyllys, do PSOL?
Toni Reis – Não. Gosto muito do Jean Wyllys, é meu amigo, tem uma postura muito atuante, inteligente. Gosto de ouvi-lo, mas eu me espelho muito no Rosinha. O Rosinha é o candidato em quem votei em muitas eleições, sempre votei no Rosinha. Inclusive um dos motivos da minha candidatura é que ele não vai ser candidato e eu não vou ter em quem votar. O Chico Alencar, do PSOL, gosto muito. Adoro a Marta Suplicy, gosto da postura aguerrida da Marta, questionando o machismo. E o próprio Lula. O Lula pra mim é o meu guru político. Eu gosto da forma conciliadora, de escutar, de ponderar, de chamar, é uma pessoa que eu tenho como referência.
Gralha – O que você pensa sobre as mais recentes decisões do STF a respeito de união homoafetiva e os desafios da criminalização da homofobia através do PLC122 no campo legal que organiza a luta LGBT para o próximo período?
Toni Reis – Nós temos um Congresso muito conservador. De 513 parlamentares, temos em torno de 150 progressistas. Percebemos que pela via parlamentar nós não conseguiríamos a união estável, o casamento. Aí fomos verificando e aprendendo com os outros. Nos espelhamos na decisão da Colômbia, que foi através da Suprema Corte. Questionamos a Constituição Federal em seus artigos que falam que todos são iguais perante a lei sem discriminação de qualquer natureza e a partir deste princípio, trouxemos o pessoal da Colômbia, ficamos três dias em Brasília, fazendo curso e entendendo o mecanismo. Aí o governador Sérgio Cabral ingressou com uma ADPF (N. R.: arguição por descumprimento de preceito fundamental – orientada a reparar lesão a preceito fundamental causada por ato do poder público).
Logo fizemos uma articulação com o Governo Federal para fazer uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade, criada para controlar a constitucionalidade de leis e atos normativos) e começamos a fazer um trabalho de visita. Eu e a equipe, com a OAB, visitamos todos os ministros, levamos as demandas, os memoriais e conseguimos, de forma unânime e com o apoio do Governo Lula. Teve parecer favorável da Advocacia Geral da União, da Procuradoria Geral da República, dos ministros. Foi muito bacana a forma como fizemos. E um dia antes, em maio de 2011, achávamos que o Ministro Toffoli não poderia votar porque ele foi o relator e tinha dado o parecer, então estava impedido.
Dos dez votos, achávamos que teríamos sete a favor e três contra. E para a grata surpresa, fomos vendo os votos e fomos nos animando. Tivemos sete votos favoráveis à união e o casamento e três votos para a não estável, com observação. Foi um trabalho bem pensado, bem estruturado. É fundamental qualquer movimento, qualquer pessoa se organizar. Tem que ter argumento e subsídio. Na questão da criminalização da homofobia estamos indo bem. Temos apoio de 70% da população. Mas temos um grupo de fundamentalistas evangélicos que acham que queremos prender pastores e padres, e não é isso. O que a gente não quer é que a pessoa fale que a homossexualidade é pecado. Pecado por pecado é você soltar cheque frio, ler o signo, buzinar na frente do hospital, mas uma pessoa espancar no trabalho, numa escola, é isso que queremos que seja criminalizado. Isso é importante.
A criminalização (da homofobia) tem caráter educativo. Um exemplo, a questão do racismo. Ela melhorou, a gente sabe, a lei não vai acabar com o racismo, mas melhorou bastante, diminuiu. Ele fica latente, por isso a gente precisa estar vigilante. Por isso precisamos de uma lei para criminalizar a homofobia, com caráter educativo, e o desafio é superar o fundamentalismo desse grupo que acha a gente vai tolher a liberdade de expressão. Eu sou totalmente a favor da liberdade de expressão desde que não fira a dignidade humana. Eu não posso sair falando coisas horrorosas das mulheres, dos negros… Não posso falar e ferir a dignidade humana. Esse é um ponto importante. Inclusive já temos jurisprudência no Supremo Tribunal Federal.
Gralha – O que dizer para aqueles que tacham os ativistas LGBT como os que querem instaurar a ditadura gay no Brasil?
Toni Reis – Uma piada. Que ditadura gay… Eu quero mais que as pessoas sejam felizes. Tem que ser feliz da sua forma, do seu jeito. Não queremos impor valores. Até brinco, já temos um monte de concorrência, não queremos fazer apologia da homossexualidade. Isso é uma tremenda babaquice, é senso comum. Uma besteira. Eu até brinco com o Silas Malafaia, o Feliciano e o Bolsanaro que são meus fregueses lá no Congresso. Nos debates eu sempre falava pra eles: “Se e quando for aprovado o casamento gay, vocês não precisam casar.” O Bolsanaro e o Feliciano não serão obrigados… e isso que aconteceu. Faz dois anos que aprovamos o casamento gay e eu não conheço um heterossexual que foi casar com um outro heterossexual…. Não vai. A lei não modifica o comportamento.
Não conheço um heterossexual que perdeu um direito. De norte a sul, leste a oeste, os 200 milhões de brasileiros, não tem um que disse eu perdi esse direito, mas agora, 10% ganharam esse direito. Se as pessoas não querem exercer esse direito, são outros quinhentos. Inclusive no movimento gay tem pessoas que não querem casar, querem ficar livres… cada um é cada um…
Gralha – Pra fechar. Quem precisa sair do armário?
Toni Reis – Sair do armário é a pessoa se assumir como ela é. Se eu sou comunista sou comunista, se eu sou homossexual, homossexual; se sou heterossexual, heterossexual. Acho que a pessoa tem que ser feliz. A finalidade da vida, segundo Aristóteles, é ser feliz. A gente tem que sair do armário e ser feliz, viver a vida com as nossas escolhas, que serão criticadas pela mãe, pelo pai, pelos irmãos, pela sociedade, mas… quase falei um palavrão…. A gente tem que ser feliz e viver de forma tranquila com essas pessoas. Tem algumas coisas que são escolhas e algumas que precisam ser aceitas. Nesse sentido quem tem que sair do armário é a felicidade.
* A cientista social Amanda Jaqueline participou da entrevista, concedida na sede do Grupo Dignidade, em Curitiba.
FONTE:  http://www.agralha.com.br/pensata-inner.php?id=847&token=f4552671f8909587cf485ea990207f3b